Desbravadores
de Torres

Convivência dos caxienses com o mar é antiga: já no ano de 1919, grupo de amigos registrou aventuras no litoral

PUBLICADO EM 21 e 22 DE JANEIRO DE 2017

TEXTO

Roni Rigon

roni.rigon@pioneiro.com



INFOGRAFIA

Guilherme Ferrari

Arelação histórica entre Caxias do Sul e Torres é repleta de fatos e curiosidades. Nos primórdios, o vínculo entre os municípios estava restrito às férias de verão. Com o passar do tempo, o caxiense descobriu o potencial econômico e o encantamento permanente das belezas naturais da cidade litorânea. Ou seja, sua convivência com o mar é antiga.

Conforme registro fotográfico, os casais Adelino Sassi, Hércules Galló e Romano Lunardi aventuraram-se para o litoral norte em 1919. Naquela época, não havia estrutura hoteleira, rodovias e comunicação com as facilidades de hoje. Mas o retiro do cotidiano, geralmente de um mês afastado do lar, garantia o deleite pela ociosidade, associado aos banhos de mar com fins terapêuticos e às caminhadas na praia para aproveitar o sol, junto ao convívio de amigos ou, simplesmente, jogar damas na varanda e pescar.

Veranistas caxienses na praia de Torres, antigamente. Em pé, ao centro, Adelino Sassi e Hércules Galló
com suas esposas, juntamente com amigos, em 1919


acervo pessoal, divulgação

Ná década de 1920, o italiano Celeste Gobbato, intendente de Caxias do Sul no período de 1924-1928, integrava um grupo formado por Orestes Manfro e Higino Lunardi. Gobbato foi um dos primeiros moradores da Praia da Cal. Ali, hoje, reside o filho dele Tito Gobbato.

Já na década de 1930, os operários do Lanifício São Pedro também veraneavam em Torres. O grupo integrado por Victorio Diligente, João Nicoletti, João Vial, Guerino Rigon e José Dal Prá enfrentava a precariedade da realidade para usufruírem o lazer da praia e retornarem fortalecidos para casa. Maria de Lourdes Diligenti Comerlato, 81 anos, filha de Victorio, recorda daquele tempo mágico, em que os quartos do hotel eram iluminados com lampião.

Henrique Grossi, 85, conheceu Torres quando tinha apenas oito anos. A lembrança é vaga, mas não esquece que seu pai alugou um carro para a viagem. Passando Tramandaí, havia esteiras de madeira no caminho, para facilitar a rodagem dos veículos e evitar atolamentos. O hotel referência era o Picoral, estabelecimento dotado de orquestra no restaurante e chalés para hospedagem. A família de Carlos Costamilan (in memorian) possui retratos do verão de 1937, com destaque para o pouso de um avião nas proximidades do rio Mampituba, acontecimento que atraiu a curiosidade dos veranistas.

Torres sempre foi dependente de estradas. O trem não chegou no passado, e a característica geográfica do local não facilitou a construção de um porto. Na década de 1960, associados ao Aeroclube de Caxias do Sul começaram se deslocar com aeronaves. Nério Grossi (1934-2009) foi um dos precursores desse tipo de locomoção. Na década de 1970, quando Torres já domiciliava inúmeros veranistas da Serra, surgiu a opção pelo táxi aéreo. A inauguração da Freeway estimulou viagens ao Litoral Norte. Quem saía de Caxias do Sul seguia pela BR-116, passando por Nova Petrópolis, Novo Hamburgo e Porto Alegre.

Em 1975, estava iniciando a obra da estrada Rota do Sol – cujo trecho entre o bairro Desvio Rizzo e São Ciro foi inaugurado em outubro de 1980. A fase seguinte, até Lajeado Grande (São Francisco de Paula), concluída em outubro de 1990, exigiu renovados esforços da CIC de Caxias do Sul para finalizar o projeto, em dezembro de 2007. O roteiro asfaltado acelerou o desenvolvimento turístico da Serra com o Litoral, certificando a fascinação do caxiense pelo mar.

Reconhecido pela dedicação ao trabalho, o caxiense também sabe usufruir o merecido momento de descanso no verão, mesmo que tenha de se envolver na reivindicação persistente de uma rodovia que facilite o fluxo rodoviário e turístico.

Nomes:
Caxias do Sul e Kalil Sehbe (imigrante libanês que atuou na indústria caxiense) denominam ruas em Torres.

Caxienses num mar de negócios

A presença empresarial caxiense é percebida, atualmente, em vários segmentos econômicos de Torres. Veranistas de Caxias do Sul não são apenas inquilinos, mas empreendedores que agregaram valores na ampliação e diversificação turística, bem como na aquisição de imóveis. O Grupo Alfred, especializado em confecções e área têxtil, expandiu seu braço na hotelaria ao inaugurar um hotel no ponto mais nobre da praia, em 1973. Esse estabelecimento, com linhas modernas, foi vendido ao Dunas Hotel, em 1981. Anteriormente, Guerino Sartori também abriu seu hotel para atender visitantes de Caxias do Sul.

Nos mercados, é possível adquirir vinhos e sucos de vinícolas como Perini e Hugo Pietro. Na fruteira Mampituba, a uva rosada é vendida a R$ 9,50 ao quilo. O atendente sabe informar a procedência e esclarecer que a fruta é cultivada em proteção plástica. Na década de 1920, seria impossível levar na bagagem ou adquirir uvas frescas. Agora, o produto está disponível e bem acondicionado para a venda.

Ainda do ramo alimentício, a indústria do sorvete faz sucesso em seus buffets. Localizados na área central da cidade, há lojas que vendem as marcas das sorveterias Urca e Sorvelândia. A Croasonho, que possui central administrativa em Caxias do Sul, mantém uma loja na elegante esquina das ruas Joaquim Porto com José históricaAntônio Picoral. A franquia é operada pelo caxiense Elton Pedron e oferece um ambiente agradável.

Orla de Torres, uma das belas paisagens do Estado, atrai caxienses de ontem e hoje


Bruno Alencastro, BD

Próximo  à Lagoa do Violão, a loja Atelier Meny Doggy comercializa vestuário para crianças de zero a seis anos. Os produtos são confeccionados em Galópolis. A Magnani Material Elétrico possui uma unidade na Avenida Rio Branco.

No transporte, a Expresso Caxiense iniciou viagens esporádicas no verão de 1949. Desde 1975, a Expresso São Marcos possui linhas diárias no ano inteiro. No verão, é ampliado o atendimento com ônibus direto.

Conforme histórico da empresa, há 40 anos, quando não havia asfalto no Estrada Rota do Sol, a viagem, com paradas na estrada, chegava durar 10 horas. Agora, dentro da normalidade, é possível fazer o itinerário Caxias/Torres pela linha direta em três horas.

Passeios náuticos
O Rio Mampituba e a Ilha dos Lobos são permanentemente apreciados graças aos passeios de barco desenvolvidos pelo caxiense Mário Polesso, 78 anos. Perceptivo do potencial de fazer uma navegação lúdica, o investimento consolidou-se como uma referência na programação turística há 20 anos. O folheto de divulgação (abaixo) é oferecido na recepção dos hotéis. Há cinco horários e percursos até a Ilha dos Lobos ou às imediações da praia da pictórica Guarita. Polesso recorda que presidiu a sociedade Amigos da Praia da Cal e se integrou na campanha para conclusão da Rota do Sol. Dois barcos turísticos de Polesso foram construídos em Caxias do Sul.

Diocese de Caxias do Sul presente no Litoral

No passado, a relação social dos caxienses com Torres transcendeu o âmbito recreativo. O vínculo se estreitou com a Igreja Católica. A denominada 8ª Região Pastoral de Torres integrou a Diocese de Caxias do Sul até 1999. Em dezembro de 1957, com apoio do bispo Dom Benedito Zorzi, foi inaugurada na cidade a Rádio Maristela. O estúdio principal
leva a denominação do antigo bispo de Caxias.

A histórica Igreja São Domingos
Emerson Ribeiro, divulgação

Dom Benedito criou a emissora para aproximar a comunidade católica no litoral. Em Torres, trabalharam os padres caxienses Antenor Vidor, Sérgio Leonardelli, Hilário Piccoli, Roberto Pezzi e Sergio Nicoletti. Já o vigário Mário Pedrotti, que atua na Igreja São Pelegrino, celebrou o casamento do médico caxiense Eduardo Festugato com Iara de Quadros, na Igreja de São Domingos, em 1967. Eduardo, além de atender no hospital de Torres entre 1965 e 1972, tem a admiração pela cidade registrada em livro: é autor da obra Torres de Antigamente.

Paisagem históricaAntônio

Quem aprecia as imagens históricas de
Torres pode sentir um certo saudosismo
dos casarões, carroças e automóveis da época. Atualmente, a paisagem registra a presença
de belas construções de edifícios e carros importados.

Nas placas de ruas aparecem os balões

Nesse contexto, também impressionam os luxuosos ônibus de turismo que transitam pelas ruas. A maioria desses veículos é montado pela Marcopolo, empresa que desenvolveu projetos específicos para atender as necessidades de quem opta conhecer roteiros turísticos via rodoviária. Todos os dias há vários veículos de linhas permanentes ou de excursão chegando com a marca Marcopolo em Torres.

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