De abril até o fim de julho, o nordeste gaúcho têm no pinhão seu grande protagonista, bem como Santa Catarina e parte do Paraná. Maior produtor do Estado, São Francisco de Paula deve colher entre 160 e 190 toneladas da semente, numa safra 10% maior que a do ano passado, segundo a Emater. Neste período, o pinhão torna-se a principal fonte de renda para centenas de famílias, além de um complemento no orçamento de muitos vendedores informais, que podem vender na beira da estrada ou percorrendo mercados e armazéns. Também serve de alimento para boa parte da fauna destas regiões, como bugios, javalis, gralhas, ouriços e papagaios-charão. É para garantir o alimento dos bichos que o Ibama estipula uma data para o início da colheita e do comércio, que este ano foi 15 de abril.

Para quem vive nos rincões mais distantes, a época da colheita também significa reviver a cada ano alguns dos rituais inerentes à cultura da extração das pinhas. Um dos mais gostosos é a “sapecada”, que marca o intervalo na colheita dos pinhões caídos ou derrubados das pinhas cutucadas com varas (subir nos pinheiros se tornou algo raro, graças à conscientização quanto ao risco de queda que ainda provoca vítimas todos os anos). Em Criúva, distrito ao norte de Caxias do Sul, os agricultores Luiz Valdineu e Rosana Olívia Castilhos receberam a reportagem em sua propriedade de 54 hectares e algo em torno de 500 araucárias para mostrar como se faz o sapeco à moda campeira.

Numa pilha generosa de grinfas (ou grimpa, resíduo do galho seco do pinheiro), se deposita uma igualmente farta quantidade de pinhões e então se acende uma fogueira. Quando a grinfa estiver queimada, só restarão as cascas tostadas, por fora, e as sementes assadas, por dentro. O descascar é mais fácil do que ao se assar o pinhão na chapa do fogão, uma vez que a casca fica mais solta. O sabor rivaliza com o do pinhão cozido na água, mas ninguém tem dúvidas de que é muito mais romântico consumir dessa forma. Não à toa, virou programa para turistas que chegam à propriedade, trazidos de uma pousada próxima:

– Quem nunca viu a sapecada tem curiosidade, porque certamente já ouviu falar. Se o tempo está bom e tem bastante pinhão, a gente sai com a turma pro campo e o pessoal se diverte. Se alguém quiser levar, a gente doa ou vende, dependendo da quantidade – comenta Rosana.

Aos 56 anos, Valdineu herdou a terra que era dos seus avós e depois dos seus pais. Ele e a esposa se conheceram num dos tradicionais bailes da Mulada, provavelmente tocado pelos irmãos Bertussi, há mais de 30 anos. O agricultor conta que até o tempo dos seus pais, muito da renda da família vinha da extração da madeira das araucárias, prática que se tornou proibida no início dos anos 1990. Foi quando começou a se colher pinhão em maior quantidade para vender, o que porém nunca representou a maior parte da renda familiar (que vem da venda de queijo e de terneiros).

O pinhão também é um dos alimentos preferidos da família, e não pode faltar quando o casal recebe a visita das filhas, que moram em Caxias. As receitas de Olívia costumam fugir do convencional. Como o marido gosta de doce, prepara uma mistura de pinhão picado com leite condensado, levada ao forno.

Outro preparo, este salgado, é pinhão misturado com molho de salame, feito com a própria gordura do salame.

– Se eu não me controlar chego a ter uma congestão, de tanto que gosto – brinca o marido.