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Envoltos
pela história

Bisnetos de Matteo e Ermelinda Gianella abrem exposição sobre o lanifício que se mistura com a memória de Caxias do Sul


Texto
Andrei Andrade
andrei.andrade@pioneiro.com

Fotos
Diogo Sallaberry
diogo.sallaberry@pioneiro.com
Felipe Nyland
felipe.nyland@pioneiro.com
Andrei Andrade
andrei.andrade@pioneiro.com

Gabriel era comissário de voo. A irmã, Eleonora, era servidora pública em Florianópolis, quando uma despretensiosa visita a uma fábrica de tecidos despertou em ambos as melhores memórias da infância no lanifício da família, que se mistura com a história da indústria têxtil de Caxias do Sul. O passeio originou o sonho que logo virou realidade, de abrir uma confecção que devolvesse ao sobrenome a identificação com o vestuário de alta qualidade e com o tratamento humanizado que percebiam faltar nas lojas de grandes redes, sempre tão impessoais. Sócios da Gianella & Mondadori desde 2012, os dois bisnetos de Matteo e Ermelinda Gianella, fundadores do Lanifício Gianella, abriram na última quarta-feira a exposição Tecendo Histórias, Vestindo Gerações, que resgata a trajetória de 103 anos desde a instalação da fábrica, no bairro Santa Catarina. A mostra poderá ser conferida até o próximo dia 22, no Shopping Bourbon San Pellegrino.

Composta por cerca de 80 itens, a memorabilia traz cobertores, sobretudos, ponchos e palas produzidos no lanifício; objetos pessoais e materiais de escritório de Matteo; artigos que serviram para campanhas publicitárias, além de uma linha do tempo em texto e fotos da fábrica em seus anos dourados, cedidas pelo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami. Também traz um mapa com os nomes de ruas, escolas e edifícios cujos nomes homenageiam membros de diferentes gerações da família. Mais do que contar a história, a intenção é fazer com que pessoas que tiveram ligação com a empresa, que no seu auge chegou a ter cerca de 800 funcionários, possam reativar lembranças e compartilhar suas vivências.

– A saudade que ex-funcionários têm da empresa é o que mais chama a nossa atenção. Hoje as pessoas gostam de trabalhar na Randon ou na Marcopolo pelos grandes complexos que são, e o lanifício representava isso para a época. Embora fosse uma estrutura rústica, de chão batido, os funcionários amavam e se orgulhavam do seu ofício. Hoje a gente vê pessoas que trabalham com todo o conforto e reclamam – compara Gabriel, 37 anos.

Eleonora, que brinca que o irmão poderia ser a reencarnação de Matteo, pela personalidade agregadora característica atribuída ao bisavô, considera que o acolhimento era uma característica especialmente da esposa de Matteo, Ermelinda Gianella, que administrou o braço de fiação da empresa, cuja marca mais conhecida era a Fios Vovó.

– É opinião unânime que ela era uma grande mulher, a grande personagem da família. Matteo Gianella chegou onde chegou por causa dela. A gente sempre ouve que ela não tinha só quatro filhos, mas sim o bairro Santa Catarina inteiro era filho dela – destaca a bisneta. 

Sonho do Museu

O estado de abandono e deterioração da edificação que abrigou o Lanifício Gianella até o fim das atividades da empresa, dói na alma de todos que defendem a preservação da memória de Caxias do Sul. Tombada pelo patrimônio histórico municipal desde 2003, a área no bairro Santa Catarina carece tanto de projetos de revitalização quanto de interessados em adquirir a propriedade, atualmente pertencente a alguns membros da família. Gabriel e Eleonora, que não estão entre os donos atuais, acalentam o sonho de ver o prédio transformado em um museu da indústria têxtil de Caxias, perenizando uma parte importante do desenvolvimento e da formação da identidade da cidade que os antepassados ajudaram a construir.

– A gente sabe que é um processo longo e difícil, que mesmo que haja interesse dos proprietários e da prefeitura, ainda depende de haver uma terceira parte, que é um investidor interessado. Infelizmente, não temos participação alguma nas decisões, mas estaremos sempre dispostos a colaborar – ressalta Gabriel.

Mobirise

Reprodução de caminhas produzidas para expor no estande do lanifício na Festa da Uva, em 1950

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Entre os produtos produzidos pelo lanifício há cobertores, palas e cachecóis

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Objetos pessoais de Matteo Gianella fazem parte dos mais de 50 itens da exposição

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Casal visionário

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Casal Gianella e filhos

Nascido na região de Piemonte, na Itália, em 1883, Matteo Gianella já tinha experiência no trabalho com tecelagem quando migrou para a América, aos 17 anos. Após alguns anos morando em Buenos Aires, migrou para Caxias do Sul em 1914 e no ano seguinte conheceu Ermelinda Viero, que viria a ser sua esposa pelo resto da vida. Inauguraram o próprio lanifício em 1915. Inteligente e criativo, Matteo construiu muitas das primeiras máquinas do empreendimento, que tinha como carro-chefe bacheiros para montaria. Conforme os negócios se expandiam, deram início a novas marcas, como a Fiação Ermelinda Gianella e as Confecções Sul-Brasileiro. Ao mesmo tempo, tornavam-se cada vez mais conhecidos pelo engajamento comunitário, contribuindo principalmente no surgimento da Paróquia de Santa Catarina.

Matteo e Ermelinda tiveram quatro filhos: Remo, Doviglio, Itália e Elite. Com a morte de Matteo, em 1942, coube à viúva e aos filhos mais velhos, Remo e Doviglio, tocar em frente o lanifício até o encerramento da empresa, no final dos anos 1980. Ermelinda morreu em 1969.

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