Uma equipe de motocross com uma correlação muito maior que dois pilotos, duas motos e uma estrutura. Há ligação de sangue que mantém a dupla Marcelo e Rodrigo Galiotto. Eles são irmãos, tocam a empresa da família e treinam juntos, mas toda essa união acaba num momento:
– Treinamos juntos e os dois focam para dar o melhor. Um dá dica ao outro para ganhar velocidade, só que quando baixou o gate (na corrida), é cada um por si – conta Marcelo.
– Na penúltima prova (há duas semanas), estávamos na última bateria que eu tinha que ficar bem, mas ele (Marcelo) poderia ganhar para somar pontos. Como o Marcelo não treina tanto, estaria mais cansado. Aí eu larguei em primeiro e não vi que ele estava do meu lado, esparramei na primeira curva e advinha? Nos batemos e derrubei ele (risos). Até os caras falaram “vocês são irmãos e ficam se batendo”, eu digo que aqui não tem tática, não é Fórmula 1 – se diverte Rodrigo.
Essas são histórias que fizeram parte de 2018 da dobradinha no campeonato regional de motocross na categoria força livre, onde Rodrigo ficou em primeiro e Marcelo o segundo na categoria força livre. Uma relação com as motos que já passam os 18 anos.
Rodrigo, inspirado pelo vizinho Mariovaldo Martini – que hoje é o mecânico da dupla –, iniciou no veloterra em 2000, então com 17 anos. Pegou gosto pelo esporte. Dois anos depois, a família comprou a primeira moto importada e a nacional ficou para Marcelo iniciar a prática nas mesmas corridas.
– A minha primeira vez com moto importada, o Eduardo Zangalli e o Beto Gianella seguraram ela na largada, porque eu não alcançava o pé no chão. Quando baixou o gate, eu larguei – lembra Marcelo.
Mas nem tudo são flores nessa história. Os dois começaram num tempo onde a internet estava engatinhando e as informações eram escassas. Aprenderam as técnica por fitas VHS e revistas que demoravam dois meses para chegar em Otávio Rocha. Lógico, vieram acidentes e ambos tiveram passagens preocupantes.
– Num treino, em 2004, eu caí e levei uma batida no lado do corpo, mas eu achava que era o cara. Andava sem colete, cinta abdominal e protetor no pescoço, porque achava que não precisava. Aí eu caí e bati o rim. Fiquei um tempo internado e voltei em 2005 a competir. Nessa época era campeão do veloterra e fui testar uma pista de motocross. Eu me achava o cara, fui pular um duplo, tranquei e bati o outro rim. Aí fui para o hospital e na ecografia o médico disse que eu só estava com um funcionando – recorda Rodrigo do susto que levou.
Depois, os equipamentos de segurança viraram artigos obrigatórios. Mas dois anos depois, no final de 2006, foi a vez de Marcelo cair um tombo forte. O acidente ocasionou um traumatismo craniano e sete dias de UTI, que quase o fizeram largar o esporte.
– Oito meses depois estava voltando a andar. O cara não consegue abandonar aquela adrenalina que está na veia. Eu me criei no motocross, ali é uma família – afirma Marcelo.
O motocross, como tantos esportes, não é barato. E essa é sempre a dificuldade para quem é amador e não depende desta atividade para viver. Até por isso, Rodrigo traçou uma estratégia para viabilizar o projeto.
– Eu abri uma loja, a Líder MX, e vendo roupas, peças e o que precisar para motos de trilha e cross. Assim custeio o esporte para nós. Eu consigo comprar as peças com preço de custo, aí consegue uns patrocínios pela relação. Tenho uma ajuda para dar uma respirada – conta Rodrigo.
Esse é um dos meios, mas o principal é patrocinador está na agricultura. Família de agricultores, eles trabalham com a venda de morangos e o principal mercado é o de Porto Alegre. Assim, a rotina envolve viagens de madrugada para entrega da fruta na Ceasa da capital.
– Muitas vezes os vizinhos pensam que é fácil os caras estão andando de moto às 16h. Mas eu acordei às 2h e trabalhei 12 horas. São horários complicados – relata Rodrigo.
– Quinta-feira desci às 4h para o Ceasa e cheguei 19h em casa. Encostei o caminhão, troquei de roupa rapidinho e vamos para pista – complementa Marcelo.
Um dos pontos que colabora é o fato de terem construído uma pista na propriedade. Com ajuda financeira de outros 15 pilotos da região, ele viabilizaram um centro de treinamentos que ajuda evoluir a modalidade na região. Além, claro, de outros benefícios para os treinos.
– Se eu subir ali e fizer três treinos de 15 minutos, já valeu a pena. Se um funcionário precisar de alguma coisa, um cara veio entregar morango, se faltar luz e precisa ligar o gerador, eu estou aqui – explica Rodrigo.
O seu Pedrinho Galiotto e a dona Geni Beber Galiotto são os grandes incentivadores da dupla. Os pais também são fãs e giram suas vidas em torno do motocross. O seu Pedrinho, inclusive, assume as entregas de morango quando as corridas são importantes nos domingos. E se a disputa for numa região de praticidade entre Otávio Rocha e Porto Alegre, ele dá um jeito de comparecer.
– Meu pai vai a Porto Alegre no domingo de manhã e na volta, se tem corrida em São Leopoldo ou um lugar perto, ele fica para assistir. Eles fazem muito isso – relata Rodrigo.
Dona Geni tem um hábito comum para uma mãe e que também faz toda a diferença para os dois filhos. Há 18 anos, em dias de motocross, ela liga para os filhos e num horário bem específico: 18h. E se acontecer alguma coisa, nem adianta tentar enganar, o sexto sentido de mãe não deixa enganar:
– O Rodrigo torceu o pé numa corrida e eu estava na ambulância com ele. O celular do meu irmão estava em cima da mesa e um amigo nosso atendeu, minha mãe pediu pelo Rodrigo e ele respondeu que estava no banheiro. Aí ela pediu: “E o Marcelo?”, ele disse que estava no banheiro também. Aí ela já entendeu que tinha dado alguma coisa e o pessoal não consegue mentir – conta Marcelo.
Texto
Cristiano Daros
cristiano.daros@pioneiro.com
Design
Andressa Paulino
andressa.paulino@pioneiro.com
Fotos
Antonio Valiente
antonio.samalea@pioneiro.com
Esporte de hoje: Motocross
Próxima Semana: Handebol
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