30 de ABRIL de 2018

+ indústria

Retomada cautelosa

indústria caxiense inicia fase de crescimento moderado e mercado de trabalho mais enxuto

Marcelo Casagrande

Mobirise

volta do crescimento | Apesar de crescer 8% em 2017, indústria caxiense terá um longo caminho até voltar ao mesmo patamar de faturamento obtido nos anos pré-crise

Mobirise



FERNANDO SOARES 
fernando.soares@pioneiro.com

Em 2000, a internet era discada na maioria dos lares brasileiros. Não existiam smartphones, apenas celulares “tijolões”. Fernando Henrique Cardoso era presidente do Brasil, enquanto Olívio Dutra ocupava o posto de governador do Rio Grande do Sul. O catarinense Gustavo Kuerten, o Guga, figurava como o melhor tenista do mundo. E, segundo o Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico (Simecs), a indústria de Caxias do Sul fechava o ano com faturamento de R$ 12,7 bilhões, um patamar semelhante ao que se verificaria quase duas décadas mais tarde. Em 2017, a receita totalizou R$ 12,1 bilhões, mesmo crescendo 8% frente ao ano anterior.

A recessão enfrentada nos últimos anos fez com que o setor produtivo caxiense entrasse no túnel do tempo para uma viagem nada agradável. Dona do maior parque industrial do Rio Grande do Sul e do segundo polo metalmecânico mais importante do Brasil, Caxias do Sul viu a indústria perder terreno. Conforme dados do Ministério do Trabalho, por meio da RAIS e do Caged, mais de 20 mil postos de trabalho foram cortados e quase 300 empresas fecharam as portas entre 2013 e 2017. No mesmo período, o faturamento anual das empresas caiu pela metade.

No ano passado, os números negativos começaram a ficar para trás. O crescimento do setor e uma tímida retomada das contratações, com 284 vagas geradas, segundo o Caged, trouxeram um alento. Mas, a partir de agora, a cautela impera entre o empresariado caxiense. Com o final da recessão, o segmento deve iniciar um novo ciclo. Uma etapa que deverá ser marcada por um crescimento constante, mas com cifras modestas.

– Teremos uma retomada do crescimento, mas de forma bem lenta. Aquele crescimento fora da curva e os recordes que tivemos antes da crise não eram reais – aponta Reomar Slaviero, presidente do Simecs.

Para as empresas de Caxias voltarem ao patamar de receita pré-crise serão necessários em torno de oito anos, na avaliação de Slaviero. Sendo assim, a recuperação total da recessão viria somente em 2026.


 Lições da crise

A euforia vivida entre 2010 e 2013, uma época com crédito farto e que trouxe recordes de vendas na maioria das companhias, dificilmente se repetirá de agora em diante.

– Não adianta ser irresponsavelmente otimista em investir em um crescimento não sustentável. Melhor termos um crescimento menor e sustentável do que picos de crescimento – pondera Mauro Bellini, vice-presidente de Indústria da Câmara de Indústria, Comércio e Serviços de Caxias do Sul (CIC).

Das temporadas de dificuldades enfrentadas pela indústria, ficam diversas lições. Na percepção de Bellini, a principal delas é “fazer mais com menos recursos”, algo que passou a ser crucial para as empresas locais seguirem competitivas no mercado.

Redobrar os cuidados com as finanças é outro ensinamento que fica. A criação de reservas se torna crucial para superar novos momentos de instabilidade.

– Tem que cuidar o caixa. Quem não cuida do caixa, não sobrevive à recessão – sinaliza o presidente da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs), Gilberto Petry.

Faturamento da indústria caxiense

(em bilhões de R$)

Fonte: Simecs

Demanda moderada

Marcelo Casagrande

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MARCOPOLO | Gomes Neto espera crescimento moderado na produção de ônibus

Aos poucos, a ociosidade nas fábricas de Caxias do Sul começa a ficar para trás. Conforme a Câmara de Indústria, Comércio e Serviços (CIC), a utilização da capacidade instalada está na casa dos 75% ao longo deste ano, o índice mais alto desde 2015. No entanto, isso não significa que as empresas voltaram a produzir na mesma intensidade de antes. Afinal, há menos funcionários nas unidades fabris e a demanda, apesar de crescente, tende a ser mais modesta.

– Vai ser muito mais moderado o crescimento da produção. Dificilmente aqueles volumes de 2010 a 2013 vão se repetir no futuro – calcula Francisco Gomes Neto, diretor-executivo da Marcopolo.

Segundo os balanços financeiros da Marcopolo, a produção de ônibus no mercado interno caiu de 18,2 mil a 7,1 mil unidades anuais, entre 2013 e 2016. Por tabela, o faturamento despencou de R$ 3,6 bilhões a R$ 2,5 bilhões. No ano passado, os números voltaram a subir. Foram fabricados 8,5 mil veículos e o faturamento atingiu R$ 2,8 bilhões. Para 2018, o diretor-executivo projeta um incremento de 15% nos negócios.

Situação semelhante também é verificada nas Empresas Randon. O diretor de Tecnologia e Inovação Sandro Trentin lembra que a produção de implementos rodoviários, puxada principalmente pelos semirreboques, despencou de 70 mil a menos de 30 mil unidades ao ano. Agora, deverá voltar a um patamar de 30 mil a 35 mil produtos em 2018.

– Não acredito que vamos voltar tão cedo aos patamares mais altos que já tivemos, de 60 mil a 70 mil produtos por ano. Vamos levar de três a cinco anos para retomar uma produção anual na casa de 40 mil a 45 mil implementos – projeta Trentin.

Durante o período da crise, as receitas da Randon despencaram de R$ 6,6 bilhões a R$ 3,6 bilhões, segundo as demonstrações financeiras. O faturamento cresceu a R$ 4,2 bilhões em 2017 e deve chegar a R$ 5 bilhões em 2018.

Participação no PIB diminui

A crise dos últimos anos acelerou um processo que já vinha ocorrendo há mais tempo: a perda de participação da indústria dentro do Produto Interno Bruto (PIB) de Caxias do Sul. Segundo dados da Fundação de Economia e Estatística (FEE), o Valor Adicionado Bruto (VAB) do setor produtivo caiu de R$ 7,6 bilhões, em 2013, a R$ 5,6 bilhões, em 2015, o último dado disponível. Isso representa uma retração de 27%, muito acima da queda no PIB de Caxias, que foi de 3,5% no mesmo período.

O peso das fábricas dentro do PIB municipal atualmente é o menor em duas décadas. Em 2015, representou 27,2% da economia caxiense. Antes do início da recessão, em 2013, representava 35,9%. No seu auge, havia chegado a 40%. A queda ocorre pelas dificuldades enfrentadas pelas fábricas e também pela expansão de outros segmentos, em especial dos serviços, que hoje respondem por 56% da atividade econômica local.

Até 2014, Caxias era dona do maior VAB Industrial no Estado. Em 2015, foi ultrapassada por Porto Alegre e caiu para a segunda colocação. 

Para a economista e professora da Universidade de Caxias do Sul (UCS) Maria Carolina Gullo, dificilmente a indústria voltará a ter o mesmo peso que teve no seu melhor momento. Ela menciona que algumas tarefas industriais, como a pintura, vêm sendo terceirizadas e acabam entrando na conta de serviços. Além disso, a cidade se expandiu e ficou com poucos espaços para abrigar novos estabelecimentos. Ainda assim, as fábricas manterão um papel importante.

– A indústria deve passar a representar em torno de 30% do PIB. Não é desindustrialização, é um processo natural para uma cidade que cresceu e desenvolveu serviços fortes – analisa.

Por outro lado, o economista gaúcho e professor da Universidade Estadual de Campinas Marcio Pochmann argumenta que Caxias do Sul acaba se inserindo dentro de um contexto de desindustrialização vivido pelo Brasil nas últimas décadas. Pochmann lembra que a atividade representa cerca de 10% do PIB nacional, quando chegou a mais de 30% na década de 1980.

– A indústria hoje é formada de resistentes, que conseguem viver em um ambiente pouco favorável à produção industrial.

Diante deste contexto, a indústria caxiense deveria se renovar, na visão do presidente do APL (arranjo produtivo local) Metalmecânico e Automotivo da Serra, Ubiratã Rezler. Para o dirigente, há a necessidade de investimento em tecnologia e inovação, buscando adequação aos processos da chamada Indústria 4.0. Outra missão, segundo Rezler, é diversificar os nichos de mercado e diminuir a dependência do ramo automotivo pesado.

Participação no PIB do município

Fonte: FEE



Peso da indústria no PIB (em %)

Fonte: FEE

As sequelas deixadas pela recessão

Diogo Sallaberry

Mobirise

recuperação judicial | Fadanelli diz que Flantech conseguiu renegociar dívidas com credores

Cidade gaúcha mais industrializada, Caxias do Sul sai da crise com menos empresas do que já teve um dia. Em três anos, 281 fábricas fecharam as portas, de acordo com os dados da RAIS, do Ministério do Trabalho. Desse montante, 151 atuavam especificamente no ramo metalmecânico, o carro-chefe do município. No total, Caxias passou de 3.127 a 2.846 estabelecimentos industriais, entre 2013 e 2016.

Mesmo com a retomada do crescimento da indústria no ano passado, as sequelas da recessão permanecem. Um empresário caxiense, dono de uma fábrica de equipamentos de proteção individual (EPIs) com 11 anos no mercado, decidiu fechar o negócio no início de 2018. A queda significativa na demanda foi o que resultou na quebra da companhia, que fornecia para a GM, de Gravataí, e companhias caxienses do setor automotivo.

Nos anos pré-crise, a produção chegou a até 5 mil equipamentos por mês. A partir de 2015, os pedidos começaram a cair. O quadro de funcionários foi enxugado de 19 a três pessoas. E as vendas seguiram em queda livre, não passavam de 200 a 300 unidades ao mês. Neste meio tempo, o empresário pediu empréstimos bancários, tentou buscar novos mercados, mas nada adiantou. Não conseguiu salvar o empreendimento.

– Não tenho mais intenção de ter empresa de novo, de ter funcionários e compromisso todo dia 5. Nos últimos nove meses, não tirei um centavo da empresa para mim – conta o empresário, que prefere não se identificar.

Além das fábricas que deixaram de existir, outras tantas ficaram a um passo da falência. Os pedidos de recuperação judicial dispararam nos últimos anos no município. Segundo o Foro de Caxias do Sul, 15 empresas na indústria recorreram ao instrumento, que consiste na renegociação das dívidas com os credores. A lista inclui nomes de peso no município, responsáveis por milhares de empregos, como Dambroz, Tomé, Vidroforte, Grupo Voges e Guerra. Esta última, inclusive, acabou tendo a falência confirmada em 2017.

A metalúrgica Flantech é uma das empresas que recorreram ao mecanismo para tentar sobreviver. Recentemente, conseguiu aprovar o plano de pagamentos junto aos credores e agora começa a esboçar uma reação. O faturamento subiu no ano passado e já corresponde a 70% da receita dos anos anteriores à crise.

– Nenhuma recuperação judicial é agradável. No início, a empresa é vista com olhos mais cautelosos pelos clientes e fornecedores. Mas conseguimos reconquistar a confiança de todos – salienta o sócio-proprietário Vicente Fadanelli.

Por conta da recessão, a Flantech passou de 120 a 25 funcionários. Com a diversificação da base de clientes, que já são mais de 20, a quantidade de pedidos voltou a subir e, com isso, hoje a metalúrgica emprega 60 pessoas.

O tamanho do setor

Fontes: RAIS/Ministério do Trabalho e Fiergs

Mobirise

Grandes empresas aumentam presença no mercado externo

Marcelo Casagrande

Mobirise

RANDON | Trentin salienta que presença no Exterior abre espaço para novos produtos em Caxias

Com o mercado interno desaquecido, as grandes empresas de Caxias do Sul intensificaram o foco no Exterior. Seja com exportações a partir do Rio Grande do Sul ou explorando suas plantas fora do país, algumas companhias viram os negócios internacionais deslanchar nos últimos anos. E a tendência é de que, cada vez mais, o mercado externo siga sendo um alvo importante.

O caso da Marcopolo é o mais emblemático neste sentido. Em 2013, a receita vinda das vendas no Brasil totalizava R$ 2,5 bilhões, enquanto o resultado obtido com exportações e com a produção de suas unidades no Exterior foi de R$ 1,1 bilhão. No ano passado, o cenário se inverteu. O mercado brasileiro rendeu R$ 1 bilhão e os negócios no Exterior injetaram R$ 1,7 bilhão no caixa.

– Nos últimos anos, os negócios internacionais representaram praticamente 70% da receita. Sem eles, a crise teria sido pior do que foi – constata Francisco Gomes Neto, diretor-executivo da fabricante de ônibus.

Mesmo com a recuperação da demanda no Brasil, Neto afirma que o mercado estrangeiro seguirá gerando a maior parte do faturamento da Marcopolo. A partir de agora, a atuação fora do país deve trazer pouco mais de 50% da receita anual. Hoje, a empresa tem produção própria em países como África do Sul, Austrália e México.

Nas Empresas Randon, os negócios no Exterior também tendem a aumentar. No ano passado, totalizaram US$ 240 milhões (aproximadamente R$ 790 milhões), expansão de 7% na comparação com 2016. Em algumas empresas do grupo, como a Fras-le, as transações internacionais já representam mais da metade da arrecadação.

Atualmente, a companhia tem produção em uma série de países, entre eles Argentina, China, Estados Unidos e Peru. Com isso, o papel da planta de Caxias do Sul se transforma, na avaliação do diretor da Randon Implementos Sandro Trentin.

– Ao invés de levarmos o produto completo para a Argentina ou Peru, levamos em partes e completamos lá. Isso abre espaço interno para novas linhas de produtos a partir de Caxias – garante Trentin.            



                                   

Mercado de trabalho mais restrito

Diogo Sallaberry

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retorno | Mattos (D) conseguiu um novo emprego neste ano

A escalada do desemprego foi um dos principais termômetros das dificuldades enfrentadas recentemente pela indústria de Caxias do Sul. Entre 2013 e 2017, de acordo com dados da RAIS e do Caged, foram cortadas mais de 22 mil vagas, incluindo a construção civil na conta. Mas, aos poucos, as contratações estão voltando.

Levando em consideração apenas a indústria de transformação, foram gerados 284 postos formais no ano passado. E, em 2018, a recuperação segue. No primeiro trimestre, o segmento demitiu 4.763 e contratou 7.227 pessoas, o que resultou em saldo positivo de 2.464 vagas. Uma dessas posições foi obtida por Diogo Gonçalves de Mattos, que no início do ano foi contratado para ser líder de produção em uma siderúrgica.

Funcionário da Guerra por 12 anos, Mattos estava inativo desde maio de 2017, quando a fabricante de implementos rodoviários interrompeu as atividades. A partir de então, passou a sobreviver de bicos, como trabalhos em restaurante e em uma lavoura. Quando surgiu a possibilidade de voltar à indústria, não pensou duas vezes, ainda que o salário oferecido fosse em torno de 40% menor em comparação ao que tinha.

– Iniciei em uma função diferente da que tinha anteriormente. É um recomeço – comemora.

Mesmo com a reação do mercado de trabalho, é pouco provável que a indústria volte a ter a mesma força produtiva que teve nos seus melhores dias. Isso porque as empresas enxugaram suas operações ao máximo, ao mesmo tempo em que a automação de processos é crescente.

– A tendência é não ter o número que tínhamos de trabalhadores, até pela questão da Indústria 4.0. A tecnologia aumenta e diminui os postos de trabalho – analisa Claudecir Monsani, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Caxias do Sul e Região.

Segundo Monsani, as novas vagas que estão sendo abertas no município têm remuneração inferior às que eram geradas no passado. A média salarial da categoria caiu de R$ 2 mil a R$ 1,5 mil. Com os trabalhadores com menos dinheiro no bolso e a redução da categoria, o número de sindicalizados despencou de 20 mil para os atuais 10,2 mil.

Pessoas empregadas na indústria (em milhar)*

*Inclui construção civil

Fontes: RAIS/Ministério do Trabalho e CIC



Peso da indústria nos empregos de Caxias (em %)

Fontes: RAIS/Ministério do Trabalho e CIC

Um novo rumo profissional

Felipe Nyland

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barbeiro | Favaro mudou de área e abriu a própria empresa

Com o corte expressivo de vagas na indústria, a alternativa escolhida por muitos ex-funcionários de fábricas foi migrar para outras atividades. Gastronomia e o mercado da beleza são os dois segmentos que mais acolheram as pessoas saídas do setor produtivo. No Senac de Caxias do Sul, a demanda por cursos nestas áreas subiu em torno de 30% somente no ano passado.

– Muita gente saiu da indústria, pegou a rescisão e investiu em um curso de capacitação. Tivemos turmas em que 40% dos alunos trabalhavam no polo metalmecânico – analisa Marcus Guazzelli, diretor do Senac.

A procura tem sido, principalmente, por cursos de curta duração e que permitem uma rápida reinserção no mercado de trabalho. Neste sentido, as capacitações para confeiteiro, cabeleireiro e barbeiro estão entre as mais disputadas. Em um ano, foram formadas aproximadamente 350 pessoas em oficinas voltadas à gastronomia e beleza.

O barbeiro Meison Favaro trabalhou mais de uma década na indústria antes de encontrar sua nova vocação. A mudança de rumo foi forçada por sua demissão de uma empresa do setor de plásticos, em maio do ano passado. Com o financiamento de seu apartamento pendente e a esposa grávida e também sem renda, Favaro apostou todas as suas fichas em um curso de barbeiro. E conseguiu se reinserir no mercado de trabalho.

Após concluir a especialização, começou a trabalhar em um salão, em Caxias. No início de 2018, decidiu abrir o próprio empreendimento. Assim, surgiu a Tauras Barbearia. O bom desempenho do negócio até agora faz com que Favaro não pense em voltar a ser industriário.

– Às vezes a gente pensa em trabalhar em uma empresa e se aposentar ali. Hoje eu quero distância disso. Mais ainda da indústria – comenta.

Em média, Favaro atende cinco clientes por dia. Como a demanda está crescendo, ele já pensa em reforçar o atendimento. Para isso, pretende contratar funcionários nos próximos meses. 


Os novos industriários

Marcelo casagrande

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mecatrônica | Casagrande (E) e Neukamp (D) pretendem trabalhar em postos ligados à tecnologia

Uma geração conectada, que aspira cargos voltados à tecnologia e não hesitará em sair de Caxias do Sul para buscar as melhores oportunidades de trabalho. Esse é um perfil comum entre os novos industriários formados pelo Instituto Senai de Tecnologia em Mecatrônica, o principal fornecedor de mão de obra para a indústria local.

As mudanças na formação vêm ocorrendo nos últimos anos e devem se intensificar conforme avance o conceito de Indústria 4.0 nas empresas. Dentro desta quarta revolução industrial, a automação crescerá ainda mais e muitas atividades manuais passarão a ser desenvolvidas por robôs. Sendo assim, as funções das pessoas dentro das fábricas tendem a ser diferentes. Os profissionais precisarão ser mais qualificados.

– O trabalho na indústria vai mudar. Se antes a pessoa limava peças, agora ela vai ter que saber programar um robô – compara Fabiano Prato Rath, gerente do Senai em Caxias.

O técnico em mecatrônica Arthur Neukamp, 19 anos, faz parte da nova geração que logo entrará na indústria. Em um primeiro momento, ele almeja trabalhar com programação dentro de uma fábrica no setor automotivo. Posteriormente, quer abrir a própria empresa.

– É muito gratificante ver um processo funcionando com a tua lógica em cima, com a tua programação – exalta Neukamp.

Atualmente, Neukamp faz parte da equipe do Senai que disputa campeonatos de mecatrônica. Ele tem a companhia do também técnico em mecatrônica Edson Casagrande, de 21 anos. Casagrande pretende atuar com robótica voltada ao setor produtivo.

– Quero trabalhar com o desenvolvimento de máquinas – aspira.

Antes de ingressarem no mercado, Neukamp e Casagrande treinam diariamente para as competições de mecatrônica. Eles são os atuais campeões do Rio Grande do Sul e vão disputar o campeonato nacional neste ano. Se ganharem, estarão classificados para o torneio mundial. Nos últimos cinco anos, três duplas do Senai caxiense ganharam a competição internacional. Posteriormente, todos conseguiram empregos na indústria.

Apesar de o curso técnico em mecatrônica ter se tornado um dos mais buscados, ainda há espaço para a formação nas funções tradicionais. Segue alta a demanda nos cursos de aprendizagem industrial, que são destinados aos jovens que buscam a primeira experiência profissional.

O adolescente Diogo Barbosa, de 16 anos, ainda está decidindo que profissão deseja seguir. Interessado na indústria, decidiu fazer um curso voltado ao setor do plástico. O jovem não hesita em dizer o porquê de sua escolha.

– Mesmo com essa crise, a indústria em Caxias é muito forte – justifica.

Marcelo casagrande

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para começar | Barbosa vê setor do plástico como alternativa

O futuro será 4.0

Mobirise

A adaptação à quarta revolução industrial, a Indústria 4.0, é um dos maiores desafios que começam a se impor às empresas do setor. Porém, avança lentamente no Brasil o uso de tecnologias como internet das coisas, manufatura aditiva (impressão 3D de peças), big data e máquinas interconectadas na linha de produção. De acordo com pesquisa realizada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), menos da metade das empresas brasileiras utilizam alguma tecnologia digital.

O gerente-executivo de Política Industrial da CNI, João Emílio Gonçalves (foto), salienta que a adoção das tecnologias será fundamental para garantir a competitividade da indústria nacional nos próximos anos. 

  • Pioneiro: Que perspectivas há para Caxias e a indústria metalmecânica dentro do contexto da Indústria 4.0?
    João Emílio Gonçalves: É um setor que temos no Brasil uma base instalada relevante de empresas que estão mais próximas do final da cadeia (produtiva) e de fornecedores. Então tem um espaço muito grande para desenvolvimento da Indústria 4.0 aí (em Caxias). Há a possibilidade de se empregar tecnologias com potencial para impactar a competitividade e que não se restringem ao chão de fabrica da empresa, mas que permitem a integração digital de fornecedores com clientes. Isso gera impacto positivo na competitividade da cadeia como um todo.  
  • Como as pequenas e médias indústrias podem se adaptar às mudanças?O tipo de tecnologia digital que a empresa vai usar depende muito do tipo de produto que ela faz, da forma como opera. O ponto de partida para entrar no mundo da Indústria 4.0 e avançar com sucesso é fazer um plano estratégico de digitalização. É identificar onde as tecnologias vão gerar maior impacto no curto prazo para a competitividade da empresa. Aí se identifica o tipo de investimento que a empresa vai ter que fazer, o treinamento da mão de obra, se vai precisar tomar financiamento, que tipo de fornecedor vai ter que contratar. Tudo o que a empresa vai fazer é definido por esse plano inicial. É uma etapa necessária para conseguir avançar com sucesso e bons resultados. 
  • Alguma tecnologia em específico deve despontar mais rápido?
    Para algumas empresas do setor metalmecânico podemos ver um papel importante de processos de automação com sensores e robotização, coisas que para outros setores podem não fazer sentido. Por isso defendemos a ideia do plano de digitalização, porque não tem uma receita igual para todo mundo. A tecnologia de uns pode não fazer sentido para outros. 
  • Quais as consequências para quem não se adaptar a essa nova era?
    Um dos grandes impactos da Indústria 4.0 é promover um aumento de produtividade muito significativo na empresa. Ficar para trás nesse processo tem consequências muito sérias. O melhor exemplo é olhar para as revoluções anteriores. Na segunda revolução industrial, quando surgiu o motor elétrico, a empresa que insistisse em usar energia a vapor, desapareceria. Na 4.0 vai ser assim, como foi nas demais (revoluções industriais). A questão é em quanto tempo isso vai acontecer. Acompanhar tendências tecnológicas, não só para ganhar competitividade, mas para desenvolver novos modelos de negócios, é uma coisa absolutamente decisiva. Uma empresa faz isso, outra também começa a fazer e, em algum momento, quem não adota o mesmo tipo de tecnologia, começa a ter dificuldades muito grandes de mercado. Essa é uma tendência da Indústria 4.0. Na medida em que as empresas forem avançando, quem permanecer fazendo no modelo tradicional, dificilmente vai conseguir se manter competitivo.