1931
João Schiavo deixa a Itália e parte de navio para o Brasil, chegando 20 dias depois, no dia 5 de setembro, em Jaguarão (RS) e, de lá, dois meses depois, segue para Caxias, fixando-se em Ana Rech.
Padre João Schiavo é o único beato de Caxias do Sul
Ele “morreu um santo”, bradavam católicos no enterro do padre João Schiavo, no dia 27 de janeiro de 1967, no distrito de Fazenda Souza, em Caxias do Sul. Ao redor do túmulo improvisado, erguido em um terreno cascalhado que antes acolhia pomares — lugar onde o padre dizia cair bem a construção de um cemitério _, tornava-se conhecida a fama de santo de Giovanni Schiavo, padre italiano batizado como João em território caxiense.
Aos 84 anos, Juvelino Cara descobre-se em um momento jamais vivido por quem não tem fé. É o milagre concedido ao aposentado, morador do bairro Sagrada Família, o responsável pela beatificação do padre João Schiavo, amigo que ele nunca pôde conhecer e ao qual diz dever sua vida. A graça que foi reconhecida pelo Vaticano tornou Cara uma personalidade conhecida em Caxias do Sul.
– “É o senhor do milagre do padre” ou ainda “é o beato”, apontam nas ruas – revela, brincando.
O fato é que 20 anos após uma trombose castigar rapidamente o intestino do aposentado e os médicos alertarem a família sobre suas últimas três horas de vida, não há quem segure o sorriso dele e da mulher, Lourdes, 79, sua fiel companheira.
– Este ano, quando eu tive uma pontada (pneumonia), eu achei que não ia durar. Achei que não ia dar tempo para ver ele ser beato – confessa Cara, emocionado.
A ligação da família com o padre começou em setembro de 1997. Naquele ano, hospitalizado repentinamente após crises de vômito, Cara foi diagnosticado com uma trombose mesentérica intestinal. Diante de uma doença grave e com raríssimas chances de cura, o médico convocou filhos e esposa para se despedirem do aposentado. Lúcido, Cara rezava com a mulher e lembra do padre que apareceu em uma madrugada, para dar extrema unção, e das enfermeiras que o vigiavam constantemente:
– Elas vinham espiar se eu já tinha batido as botas, porque o médico avisou que era rápida a coisa.
Lourdes, então, pegou na bolsa um santinho com a oração do padre Schiavo que havia recebido dias antes da madre Elisa Rigon. O casal recebeu o cartãozinho ao visitar o túmulo de uma vizinha em Fazenda Souza. A madre comentou que a comunidade só aguardava um milagre para Schiavo se tornar santo.
– Eu pensei: meu Deus, tomara que não seja na nossa família, porque para precisar de um milagre, alguém precisa estar muito mal – recorda Lourdes, revelando que o santinho não existe mais porque ela o segurou com tanta força naquela noite que o papel se esfarelou.
Schiavo se tornará beato graças à confiança da família Cara e da multidão que visita o seu túmulo em Fazenda Souza. Nem o médico acreditou na reviravolta da saúde de Cara e que, anos depois, o Vaticano atestou: a cura não tem explicação médico-científica. Neste sábado, entre os milhares que lotarão os Pavilhões, o casal promete estar alinhado e sorridente, na primeira fila em frente ao altar.
– A roupa está pronta, vamos usar um traje que só foi usado uma vez. E marquei salão de beleza – confidencia Lourdes.
Aos 80 anos, padre Orides Ballardin é postulador da causa de beatificação do padre João Schiavo, isto é, o encarregado de um trabalho exaustivo que se iniciou em 2001 e envolveu até mudança para o Vaticano, em 2009. Padre Orides diz que chegou a adoecer tamanha dedicação, mas comemora poder vivenciar de perto um dos momentos mais emblemáticos da sua carreira diocesana. Para ver João Schiavo beatificado, Ballardin encaminhou um dos mais de150 relatos de milagres atribuídos ao padre. Ao retornar para Caxias do Sul com um “sim” do Papa Francisco na bagagem, ele sentencia:
— Estou encerrando com chave de ouro minha vida. Achei que eu não o veria beato, mas estou muito feliz. A comprovação do milagre é a voz de Deus se manifestando.
Padre Orides, junto da madre Elisa Rigon, já falecida, ajudou a catalogar documentos e ouvir devotos de Schiavo que tiveram graças alcançadas. Também elaborou a história do venerável, intermediou encontros no Vaticano e, mesmo com saúde debilitada, convidou a população para o evento deste sábado. A festa é a consequência deste trabalho árduo e motivador do padre que tem Schiavo como inspiração religiosa.
— Ele me acolheu no seminário, me ensinou tudo que sei sobre ser padre. Eu fiz um acordo com ele: disse-lhe que consigo a beatificação, e ele cuida da minha saúde. E vamos chegar neste fim de semana, juntos — declara.
Quando ainda era guria, os fins de tarde da escriturária aposentada Rosa Gerica Graziela Calabró, 75 anos, eram acompanhados de um abraço caloroso do seu tio João Schiavo. Era rotina: ao chegar em casa, vinda do trabalho, encontrava João à mesa com a mãe dela, Ida Schiavo Calabró, irmã do padre. O café da tarde na moradia da família Calabró, no bairro São Pelegrino, era um dos compromissos cotidianos que João não abria mão quando tinha agenda na área central de Caxias — o que se repetia frequentemente.
A conversa em dialeto, o café quentinho e a mesa posta rememoravam os tempos da Itália, antes de a família Schiavo deixar a cidade de Santo Urbano para migrar para Caxias. Na mesa, não podia faltar grostoli “quase transparente de tão fininho”. O papo era doce, como as lembranças que os três sobrinhos que ainda vivem em Caxias do Sul têm do mais novo beato da diocese.
O professor aposentado Francesco Calabró, também sobrinho de Schiavo, é um dos encarregados de receber uma comitiva de mais de 30 italianos que desembarcaram em Caxias especialmente para a beatificação. Destes, sete são parentes do padre, sendo três sobrinhos. Há gente com mais de 80 anos na excursão. Eles são de Santo Urbano, e aproveitam o evento para conhecer mais a Serra, já que em virtude da popularidade do padre no Brasil, eles já vieram em outras ocasiões.
O público que comparecer aos Pavilhões da Festa da Uva neste sábado irá conferir um evento de porte nacional. Isto porque a primeira beatificação realizada na Diocese de Caxias do Sul deve atrair pelo menos 15 mil pessoas – ainda que a organização prefira não focar atenção em números, há uma megaestrutura montada no Pavilhão 2. Os portões abrem às 8h, e a missa deve se iniciar às 10h, com previsão de duração de duas horas.
A simbologia promete deixar a cerimônia carregada de emoção. O responsável por comandar a cerimônia é o representante do Papa, prefeito da Congregação das Causas dos Santos, cardeal Angelo Amato, que contará com a participação do bispo da Diocese de Caxias do Sul, dom Alessandro Ruffinoni.
A beatificação será um momento raro para uma comunidade, já que há mais de 4 mil causas aguardando avaliação no Vaticano. O tempo que o padre João Schiavo levou para conquistar esse título – que é somente um passo antes da santidade – foi relativamente rápido, reconhece o postulador da causa, padre Orides Ballardin:
– (O processo) se iniciou em 2001 e, exatamente neste ano da beatificação, celebramos os 50 anos de morte do padre João e os 20 anos da cura que o Vaticano reconheceu como milagre.
Um rito deve diferenciar a cerimônia deste sábado de uma celebração comum. O bispo dom Alessandro irá pedir, em nome de todos os bispos, que o cardeal italiano inscreva Schiavo como beato. Após, o padre Ballardin subirá ao palco para fazer uma breve apresentação sobre vida e obra do beato para que a comunidade saiba um pouco mais sobre sua história. Após, ocorre o grande momento da cerimônia: a leitura da Carta Apostólica em duas línguas, latim e português. Ela foi elaborada e assinada pelo próprio papa Francisco. A partir deste momento, Schiavo já será considerado oficialmente beato.
Além do religioso josefino, foram reconhecidos como beatos no Rio Grande do Sul o padre Manuel Gomes Gonzales, o coroinha Adílio Daronch e a madre Bárbara Maix. Com a beatificação de Schiavo, o Brasil alcança 52 beatos e 36 santos. O país tem ainda 12 veneráveis, que aguardam apenas a aprovação de um milagre para se tornarem beatos.
O aposentado Ivan Oliveira Reis, 69 anos, abre a porta de sua casa no distrito de Fazenda Souza vestindo uma camiseta que estampa o rosto do padre Schiavo. A roupa não é exclusiva para a foto do Pioneiro: Reis tem três peças semelhantes e adora desfilar pelas ruas de Caxias com elas. Já viajou até a Itália divulgando Schiavo na camiseta. Na cozinha de casa, há fotos do padre e recortes de jornal que tratam sobre vida e obra do religioso. O amigo deixou saudade para Reis e a mulher, Elsa Vanassi dos Reis, 73, que aprendeu italiano com o padre.
Assim como o casal, a comunidade de Fazenda Souza vive uma euforia nos últimos dias com a aproximação da beatificação de seu padre mais querido.
A programação da beatificação seguirá pelo fim de semana. Ainda no sábado, a partir das 16h, será celebrada uma missa em espanhol para grupos de estrangeiros. A cerimônia ocorrerá na capela onde está o túmulo do padre, em Fazenda Souza, e será presidida pelo superior provincial da Província Argentina-Chile, padre José Luís Di Paolo, e sacerdotes estrangeiros.
João Schiavo deixa a Itália e parte de navio para o Brasil, chegando 20 dias depois, no dia 5 de setembro, em Jaguarão (RS) e, de lá, dois meses depois, segue para Caxias, fixando-se em Ana Rech.
É ordenado o primeiro mestre de noviços da missão Josefina no Brasil. Vive sua vocação e missão como animador de seminaristas e noviços e educador no Colégio Murialdo de Ana Rech.
Pe. João é transferido para Galópolis, onde exerce a função de pároco e diretor da escola. Institui paróquia a Cruzada Eucarística envolvendo mais de 200 crianças.
Com a saída dos Josefinos de Galópolis, retornou para Ana Rech como mestre de noviços e assistente dos seminaristas. Coube-lhe a direção do Colégio Murialdo.
Idealiza e ajuda a fundar o Seminário Josefino no distrito de Fazenda Souza
Cria a Escola Normal Rural Murialdo de Ana Rech, em parceria com
o Estado.
Atua como provincial dos Josefinos no Brasil entre 1946 e o final de 1955.
Assume um Abrigo de Menores em Pelotas. Ao mesmo tempo, busca parcerias para abrir o Abrigo de Menores São José, em Caxias do Sul.
Inicia o acompanhamento de vocacionadas à vida religiosa no carisma de Murialdo, preparando a fundação das Irmãs Murialdinas no Brasil.
Funda a Paróquia do Patrocínio de São José e a Obra Social em Porto Alegre.
Findado o trabalho como superior provincial, passa a morar no Seminário de Fazenda Souza e a se dedicar à orientação de confrades e seminaristas da província. Também se preocupa com a organização das Irmãs Murialdinas, tornando-se administrador e formador.
Com a ajuda da irmã Elisa Rigon, Schiavo continua sua vocação de educador e funda o Colégio Santa Maria Goretti das Irmãs Murialdinas, no interior de Fazenda Souza.
Schiavo, cuja saúde há tempo está debilitada, adoece gravemente
no final de novembro de 1966 e morre no dia 27 de janeiro de 1967, aos
63 anos.
Compartilhe