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Foco, força e
...tempo

Osvaldo Molina da Fontoura, judoca de Flores da Cunha, se divide entre a pesada rotina de trabalho e o tatame, como lutador e árbitro

Arte marcial criada para defesa pessoal e voltada à disciplina e ao desenvolvimento da mente. Assim, no Japão, foi desenvolvido o judô. Considerado por alguns como o xadrez dos esportes de luta, ele não exige machucar, agredir ou inibir o adversário. É preciso ter técnicas das mais variadas para levá-lo ao solo e num tempo máximo de quatro minutos.

Se o conceito “derrubar” o oponente parece simples, as regras para a pontuação são na maior parte das vezes subjetivas. Tudo depende da interpretação dos três árbitros que avaliam cada movimento e golpe do atleta. Para tanto, este esporte tem algo peculiar.

Para ser árbitro, não basta estudar as regras. É preciso ter a vivência do tatame e ser faixa preta para ocupar a função nas principais competições.

Osvaldo Molina da Fontoura, 26 anos, se divide entre as duas tarefas no tatame. Natural de São Gabriel, na Campanha Gaúcha, ele é judoca desde os 13 e também é árbitro em competições locais.

Não é difícil de perceber os motivos pelos quais o morador de Flores da Cunha vem a Caxias do Sul pelo menos três noites por semana para treinar: a dedicação e o amor pela modalidade. A concorrência na rotina puxada é grande. E os quatro minutos de uma luta parecem uma eternidade quando comparados a tudo que envolve o dia a dia de Osvaldo.

O atleta treina às terças, quintas e sextas na academia de judô Torino/Nintai, faz musculação diariamente e ainda se desdobra entra a profissão de eletricista de manutenção, em Flores, e as aulas em duas faculdades – educação física e gestão em produção industrial. Ainda sobra tempo para a esposa Rita Cássia Riboli da Fontoura, 38 anos, e a filha Maria Vitória, de apenas três anos. 

– A motivação é tentar deixar um legado e fazer história no judô caxiense. Levar o nome da academia e fazer com que ela se torne conhecida e sirva de espelho para novas gerações. Além, é claro, de ganhar títulos nacionais e estar “incomodando” os atletas de elite – comenta.

Vislumbrando ser professor e trabalhar efetivamente no esporte, o judoca também ministra aulas em Flores da Cunha, em um projeto vinculado a Torino/Nintai, que atende a cerca de 10 alunos:

– Comecei no ano passado. Pretendo trabalhar com essa turma e fazer com que o judô se desenvolva lá. Fui para lá por causa da minha esposa e do meu trabalho. Senti uma dificuldade grande porque não tinha o judô.

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  • Jigoro Kano, criador do judô, em 1882, e o responsável pela reforma do jiu-jitsu, foi o primeiro japonês a fazer parte do Comitê Olímpico;
  • Em 1964, exatamente em Tóquio, o judô entrou pela primeira vez nos Jogos Olímpicos com caráter demonstrativo, 22 anos após a morte de Kano;  
  • O judô feminino só se tornou olímpico em 1992, nos Jogos de Barcelona.  
  • Em Mundiais, o Brasil acumula 44 medalhas, sendo sete de ouro, 12 pratas e 25 bronzes. Destaque para os gaúchos João Derly, duas vezes campeão, e Mayra Aguiar, com dois ouros e dois bronzes;  
  • O judô mudou suas regras de pontuação e tempo de luta no início de 2017; 

Desafios contra a balança 

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A temporada está sendo de glórias para Osvaldo Molina nos tatames. Em maio deste ano, foi campeão gaúcho na categoria acima de 100kg, na competição disputada em Dom Feliciano. Em agosto, o peso diminuiu, mas a conquista não. O judoca foi campeão metropolitano, em Canoas, entre os atletas até 100kg.

Todas essas conquistas nem passavam pela cabeça do adolescente de 13 anos vindo de São Gabriel e que se destacava nas competições colegiais de vôlei.

– Minha família sempre me incentivou a praticar esporte. Quando eu estava no ensino fundamental, um colega de escola me indicou o judô. Éramos uns 40 alunos num projeto e só eu acabei ficando. Fui trocando de faixa, competindo. Sempre gostei de competir. Minha trajetória no judô seguiu porque eu queria muito ser faixa preta e consegui isso com 18 anos – lembra Molina, ao citar que também jogava handebol, basquete e futsal.

Os desafios de 2018 não param. O maior deles talvez seja a mudança de categoria. Para o ano que vem, a meta é competir nos 90kg. Hoje, o judoca está com 98kg, mas participou da maioria dos torneios acima de 100kg. O objetivo é competir em alto nível no cenário nacional.

oria acima de 100kg e tenho uma estatura pequena para isso. Fui para o sul-brasileiro esse ano e lutei com o Rafael Silva, o “Baby”, e me senti pequeno perto dele. Foi um aprendizado, mas serviu para sentir que tenho condições de brigar por títulos nacionais – diz o lutador, 7º lugar no brasileiro regional, em Itapecerica da Serra (SP). 
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  • O judô chegou ao Brasil em 1922, junto da imigração japonesa;
  •   O primeiro ouro olímpico do judô brasileiro foi conquistado em 1988, por Aurélio Miguel, nos Jogos de Seul, na Coreia do Sul; 
  • Em 2008, em Pequim, Ketleyn Quadros foi bronze e se tornou a primeira brasileira a ganhar medalha em esporte individual; 
  • Sarah Menezes foi a primeira brasileira a ser ouro no judô olímpico. A conquista veio em Londres, em 2012;  
  • Nas últimas Olimpíadas, o Brasil levou três medalhas no judô: ouro com Rafaela Silva (peso leve) e bronze para Mayra Aguiar (meio-pesado) e Rafael Silva, o “Baby” (acima de 100kg); 
  • No judô, o Brasil já faturou 22 medalhas olímpicas.

“Nunca pensei em desistir”

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Apesar de ter um sonho de chegar a competir entre os melhores do país e do mundo, o judô nem sempre esteve lado a lado de Osvaldo Molina. Por quase seis anos, os treinos ficaram cada vez mais escassos, o rendimento diminuiu, a balança virou inimiga. Tudo em virtude dos horários de trabalho como eletricista de manutenção.

– Fiquei sete anos sem competir pela questão de trabalhar nos finais de semana. Muitos dias ficava sem treinar também por causa das faculdades. Também fiz cursos na área em que trabalho na empresa. Tive que deixar o judô um pouco de lado – recorda.

Obviamente, foram os piores momentos do lutador: 

– Foi um período muito difícil. É um esporte que está no meu sangue e só conseguia treinar quando sobrava algum tempinho. Eu pesava 86kg e sem os treinos cheguei aos 116kg. Mas nunca pensei em desistir. Meu professor sempre fala que a gente bebe um pouco desta “cachacinha” que é o judô e não consegue largar mais. Eu posso ficar afastado do judô por uns 10 anos, mas sempre vou voltar.

Além da família, a referência para enfrentar as dificuldades também vem de longa data. Foi com o professor Fernando Luiz Brito Kuse que Osvaldo deu seus primeiros golpes no tatame.

– Comecei num projeto porque meus pais não tinham condições de pagar aulas. Depois esse projeto terminou e o professor Fernando me acolheu numa outra atividade em que ele dava aula. Foi quem me incentivou, me auxiliava, dava todo o apoio para que eu conseguisse treinar. Pretendo seguir treinando a vida inteira com ele, que é uma das minhas referências no judô, assim como os professores, Miguel Augusto Kuse e Matheus Cunha Lima – detalha o lutador, que elenca o multicampeão Tiago Camilo como o principal nome do judô brasileiro na atualidade.
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Texto
Renan Silveira
renan.silveira@pioneiro.com


Design
Andressa Paulino
andressa.paulino@pioneiro.com
Juliana Rech
juliana.rech@pioneiro.com
Rodolfo Guimaraes
rodolfo.guimaraes@pioneiro.com


Fotos
Marcelo Casagrande
marcelo.casagrande@pioneiro.com


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