O esporte amador e a rotina profissional precisam de conciliação. Geralmente essa realidade é conhecida aos 18 anos, quando a vida adulta enfim bate à porta. Porém, com o passar do tempo, o momento de decisão chega cada vez mais cedo.
Conciliar tempo entre a atividade desportiva e cursos profissionalizantes, por exemplo, é uma realidade para muitos jovens. É o caso de Eduardo Gavirague, 17 anos. Ele é atleta de uma modalidade pouco conhecida no Brasil, o hóquei.
m um momento de fazer escolhas importantes para o futuro, Guavirague concilia os treinos da modalidade com a escola e a função de jovem aprendiz. Sendo assim, só restou o turno da noite para se dedicar ao hóquei. Aí vem o problema: ele treinava em um projeto da Secretaria de Esporte e Lazer de Farroupilha, que atende crianças do município no contraturno escolar. Ou seja, para treinar à noite foi necessário correr atrás de time para que o professor do projeto mantivesse uma equipe sub-18.
– Eu e outro colega treinávamos e entramos no Senai. Como eram todas as tardes, tínhamos que decidir parar ou achar uma solução. Falamos com o professor se ele conseguiria um horário à noite e a resposta foi que seria possível se tivéssemos pessoas para treinar. Aí começamos a ir atrás de outros, até montar um time – relembra o jogador.
Para contar essa história, ainda é preciso regressar quatro anos. Com 13, Eduardo estudava pela manhã e participava do projeto à tarde. Sem dar certo no futebol, ele migrou para o basquete. Não gostou. Então, um amigo o convidou para conhecer o hóquei e a primeira aula, junto aos bons resultados de adaptação, o levaram para a modalidade. Por meio do professor Daniel Flores, foi mais um conquistado pelo taco.
– Foi num Gauchão, em Porto Alegre. Na época, eu era sub-13 e entrei muito nervoso na quadra. Ainda estava me adaptando e era reserva. Foi pouco tempo depois de iniciar as aulas. Quando entrei na quadra, eu lembro que estava muito nervoso porque estava competindo com outras pessoas, que treinavam há mais tempo. Tinha medo de errar – lembra o jovem.
A partir daí, Gavirague evoluiu. Conheceu outras cidades, competições e chegou ao ápice. O time foi ao Rio de Janeiro para disputar o Brasileiro, há dois anos, e acabou na segunda posição. A diferença é que os meninos de Farroupilha sempre jogaram indoor e o nacional foi de grama. Mudam muitas regras, mas os jovens tiraram de letra.
O amor pelo esporte é tanto que o farroupilhense não poderia deixar acabar. Assim, correu atrás para seguir treinando à noite, o que fez o professor ficar sem palavras para descrever o empenho.
– A preocupação da direção do departamento era se eu aceitaria trabalhar uma hora à noite. Fiquei muito feliz porque todo meu esforço de colocar o esporte em prática foi reconhecido ali. De convencer a gurizada, de ser algo feito por eles, para não pararem de jogar e arrumar um
Grupo se reúne uma noite por semana para treinar em Farroupilha
Hoje, Gavirague divide as quintas-feiras em três turnos. Mas o esporte vai bem além da quadra e dos treinos. Ele sabe muito bem que também pode servir para sua vida pessoal e profissional.
– Quando precisa de uma solução rápida, já estou acostumado. Às vezes, quando se está treinando, tu planejas um toque e a marcação fecha o espaço. Tem que procurar uma outra possibilidade na hora e quando isso acontece na vida já está mais preparado – destaca o farroupilhense.
As pretensões não são de virar um atleta. Para evoluir mais, seria necessário estar no eixo Rio-São Paulo, onde a seleção treina. Ainda assim, Gavirague destaca que não pretende abandonar a prática da modalidade:
– É um hobby que não quero deixar de fazer. Tenho ideias de profissão e, se eu conseguir conciliar com a faculdade, será muito bom. Também quero seguir competindo, que sempre é bom.
O professor Daniel Flores conheceu a modalidade através de um projeto de divulgação da Federação Brasileira de Hóquei. Na busca por disseminar a prática, tanto na grama quanto nas quadras por todo o país, representantes percorriam prefeituras e escolas oferecendo cursos, além dos materiais básicos para iniciar as aulas com as crianças. O ano era 2013 e o professor aceitou o desafio.
Ele fez cursos, conseguiu o material da federação e foi para a primeira aula. A aposta dele e da prefeitura deu certo.
– Como era uma modalidade diferente, muito ativa, ela atrai os olhares e a curiosidade dos alunos. A aceitação ocorreu na hora. Com um mês estava com turma cheia – recorda Flores.
Mas o professor foi além. Criou um time e quis competir, queria conhecer mais sobre como o esporte estava no Estado. Apostou de novo para seguir aprendendo.
– Tomamos goleadas (no primeiro estadual disputado, em 2013), mas valeu pela experiência dos alunos. Nos anos seguintes, foi-se aperfeiçoando o treinamento porque é difícil achar materiais sobre didática. Aí eu pego um pouco do basquete, do vôlei, do futebol e vou adaptando ao hóquei. Aos poucos, fui aperfeiçoando os meus treinos, entraram alunos, participamos de campeonatos e conseguimos quatro títulos estaduais e dois vices nacionais – lembra o professor.
O hóquei de Farroupilha evoluiu tanto que, após a conquista do vice-campeonato nacional, em 2014, acabou sustentando algumas famílias dos praticantes.
– Como ficamos em segundo, a gurizada ganhou por um ano o bolsa-atleta (dado pelo projeto olímpico Rio 2016). Um incentivo do governo e que sustentou a família de muitos alunos. O valor era de R$ 925. Um esporte que nem conheciam, foram disputar um nacional, segundo lugar e no ano seguinte ganharam um auxilio do governo para continuar – destaca Flores.
A experiência valeu a pena e auxiliou para que muitas realidades fossem alteradas.
Texto
Cristiano Daros
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