Duas realidades distintas e um sentimento parecido por um esporte específico, o rúgbi.
– O rúgbi é vida. Um lugar onde acabo desopilando do stress do dia a dia e uma atividade esportiva que me dá saúde, além de amigos. Um lugar que faz parte da minha vida – afirma o pilar Jardel Vettorato, de 32 anos.
– O rúgbi é o momento que eu esqueço de tudo que está acontecendo no mundo. Quando eu entro dentro de campo só penso naquilo ali. Pensa que a nossa vida é uma panela de pressão, aquela válvula de escape é o rúgbi para mim – considera o fullback Jonatan Streb, de 24 anos, o Juca.
Nossos dois personagens vivem em mundos quase distantes. Jardel é policial rodoviário federal em Bento Gonçalves, mora em Porto Alegre e defendeu as cores verde e branco do Farrapos, vice-campeão do Super 16, neste ano. Juca é projetista na Grendene de Farroupilha, mora em Caxias do Sul e defende o vermelho, preto e branco do Serra Gaúcha Rugby, vice campeão da taça Tupi e que conquistou o acesso à elite na repescagem.
Por mais que eles só se cruzem dentro das quatro linhas do campo, ambos compartilham de rotinas desgastantes para conseguir realizar seu esporte favorito e em alto nível. Além das jornadas de trabalhos, têm todo um trabalho físico, técnico e de alimentação rigorosa para conseguir estar em campo nos fins de semana.
– Minha rotina é complicada. Eu trabalho em Farroupilha, estou das 6h às 18h fora de casa. Aí eu chego em casa e vou para aula, onde estudo de segunda à sexta até às 22h. Segunda, terça, quarta e sexta vou para academia depois da aula e na quinta treino com o time quadra sintética no Rei da Bola. No horário que sobra, eu aproveito para estudar – conta Juca.
Jardel trabalha com a segurança pública. Uma jornada de alto desgaste psicológico, já que são 24 horas nos plantões. Aliado a isso, ele mora na capital gaúcha, onde mora com a esposa e a filha.
– Eu procuro, quando sai a minha escala de serviço, já organizar com os treinos e só depois eu vou para casa – destaca o pilar, que complementa:
– Quando tem a folga entre os plantões e estou treinando. Em Porto Alegre, fico na academia. Nas terças e quintas, quando possível, estou em campo.
Essa rotina pesada dá resultados. Principalmente quando o assunto é o ganho pessoal. O mais difícil seria ficar longe dos campos, essas rotinas eles tiram de letra por algo que os encantou desde o primeiro contato com a bola oval.
– Uma recompensa pessoal, fazer o que gosta, se sentir bem, ter um amigo do lado que trabalha junto contigo. A única coisa que leva para casa é um monte de hematoma, dor e andar durante a semana meio torto. Mas ver que seu companheiro de time tem o mesmo brilho no olhar de vir aqui treinar, com chuva, frio, para jogar no fim de semana. E segunda já estar trabalhando das 7h30 às 17h30min. Depois de ver que todos estão aqui treinando com a mesma gana, isso nada paga – considera Jardel.
E esse é o maior ensinamento do rúgbi: companheiros. Um esporte que depende de todos.
Jardel Vettorato (C) é um dos principais símbolos do time de Bento
Jardel é natural de Três de Maio, mas mora em Porto Alegre. Só que o rúgbi o fez ser identificado com Bento Gonçalves. Mas para entender isso é preciso lembrar de como o Farrapos surgiu na sua vida.
– Conheci o rúgbi em Santa Maria, quando estava terminando a faculdade de direito (em 2009). Os colegas que praticavam o esporte me convidaram e acabei gostando. Aí eu voltei para Porto Alegre para trabalhar e comecei a jogar num time de Novo Hamburgo. Em 2011 vim para o Farrapos, quando eles subiram para a primeira divisão nacional – recorda Jardel.
Foi através do time de Bento Gonçalves que o camisa 3 chegou à seleção brasileira. E de lá só saiu por um ano e dez meses, quando foi nomeado como agente da PRF, em 2016. Ele acabou deslocado para Mato Grosso. Mas seu papel dentro do rúgbi, ao defender os tupis (seleção nacional), foi decisivo para voltar para Bento Gonçalves.
– Em setembro do ano passado, o departamento entendeu que era de interesse que eu voltasse a jogar na seleção. Aí me trouxe para casa e, também, não interferiu em nada para o departamento de polícia – destaca.
E a volta foi em alto nível. Em 2018, Jardel esteve em um momento importante para o rúgbi brasileiro: a vitória dos Tupis sobre a Argentina, em Buenos Aires, no mês de maio.
A história com o esporte é bem sucedida. Não à toa Jardel é chamado de ídolo pela torcida. Isso se justifica pelas atitudes em campo. E o público reconhece isso também nas ruas.
– O público aqui de Bento Gonçalves é identificado com o rúgbi. Aí tem várias pessoas que reconhecem e já te dizem: “vamos caprichar sábado”. Isso é bacana. É divertido – diz Jardel, que completa sobre o Farrapos:
– Eu me identifico muito com o clube por essa amizade. Sempre fui muito bem tratado, eu e minha família.
Juca foi o principal pontuador do Serra Gaúcha na Taça Tupi de 2018
O artilheiro do Serra Gaúcha Rugby, com 139 pontos em nove jogos da Taça Tupi, iniciou sua carreira dentro do rúgbi no Parque dos Macaquinhos.
Por mais estranho que pareça, era lá que o Serra Rugby fazia os treinos para quem estava iniciando. Aulas básicas de passe e das regras. E lá que, em 2010, Juca teve seu primeiro contato com a bola oval.
Mal sabia o atual camisa 15 que, dois dias depois daquela quinta-feira, viveria um momento complicado para o clube. Uma briga após um jogo ocasionaria uma divisão e a criação de dois times de rúgbi na cidade: Serra e Walkirians. E ele foi jogar no segundo.
O retorno ao Serra viria apenas em 2014, quando Juca teve sua primeira grande experiência, com o vice na Taça Tupi. Os avanços pessoais mostraram que esse era o caminho.
Só que as temporadas seguintes não tiveram o resultado esperado. Sem muita empolgação, Juca programou sua vida de uma forma diferente em 2018. Por sorte, mudou de ideia.
– Tinha colocado como meta não jogar e me dedicar à faculdade. Parecia que seria um ano meio quebrado e o pessoal pediu que eu fosse jogar. Eu comecei a me empolgar, vi que tinha um grupo se puxando mesmo – destaca Juca, que complementa:
– Essa temporada posso dizer que foi minha melhor dentro do rúgbi. Tanto no clube, como com os amigos e em campo. Tive uma pontuação muito boa. Sempre fui o responsável pelos chutes de conversão e esse ano tive o melhor aproveitamento. Foi gratificante e, deu um gostinho diferente – Juca
Agora o foco é evoluir. Afinal, em 2019, o fullback estará na elite do rúgbi nacional.
Texto
Cristiano Daros
cristiano.daros@pioneiro.com
Design
Andressa Paulino
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Fotos
Porthus Junior
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Lucas Amorelli
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