LUIZ FERNANDO
DEL RIO HORN
Coordenador do Procon Caxias do Sul
Em que exato momento a percepção do todo é perdida?
O desprendimento entre a realidade e as certezas parciais não é uma condição restrita àqueles desprovidos de razão. Pelo contrário, acomete a pessoa comum, uma comunidade, até mesmo populações inteiras. A história é fértil ao revelar uma multiplicidade de casos do gênero, e o Brasil da atualidade parece ter assumido idêntica postura, pautado pela superficialidade nos assuntos da contemporaneidade.
Prova disso é a celebração, no mês de setembro, dos 27 anos do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, o CDC. Diploma legal vanguardista a reconhecer a vulnerabilidade do consumidor em padrões massificados e automatizados como algo inerente à falha estrutural do mercado, e não mera debilidade bilateral entre particulares regido pelo individualismo exacerbado. Em contrapartida, data do ano de 1990, época anterior à internet, aos smartphones e um sem números de outras invenções inseridas no cotidiano das pessoas.
Sua validade e aplicação para conflitos de natureza puramente analógica permanecem incontestes, apesar da omissão na previsão de ações estatais de estímulo à autoproteção, bem ilustrado na internalização de direitos provenientes de ações educativas permanentes. No entanto, o mesmo não se pode dizer quando se trata da maior adversidade da atualidade, retratada na intensificação do desequilíbrio de forças entre consumidores e fornecedores em ritmo crescente e em novos termos.
Desigualdade crescente decorrente do universo tecno, dos quais se dá destaque às tecnologias de fronteira, ilustradas nos dados, na biotecnologia, na nanotecnologia, na inteligência artificial e na robótica. As recentes reações e esforços em favor da atualização do CDC já computam alguns anos sem qualquer êxito, inebriadas pelos interesses segmentados e pelas pautas prioritárias de um processo legislativo federal inócuo. Os escassos sucessos que se avistam apontam para a emergência de uma regulação restrita ao comércio eletrônico, muito aquém das necessidades da realidade automatizada.
As recentes reações em favor da atualização do CDC já computam alguns anos sem qualquer êxito
Nessa linha, basta citar a incipiente tecnologia da conectividade 5G, a permitir a interação permanente entre uma gama de produtos e seus fabricantes, num ininterrupto fluxo de dados entre consumidores e fornecedores, em um só sentido. Essa inafastável ferramenta de mercado, trivialmente designada por internet das coisas, vai potencializar o atendimento das necessidades e desejos dos compradores a um nível de personalização nunca antes visto. Por outro lado, irá acentuar uma realidade presente e imperceptível às pessoas: a do diálogo direcionado.
Os grandes fornecedores, a partir de perfis de consumo elaborados com os diversos tipos de dados obtidos das pessoas, passarão a deter derradeira posição privilegiada na relação para traçar perguntas dirigidas previamente elaboradas. Situação ignorada pelo consumidor em geral, mas fato corrente no dia a dia quando das abordagens abusivas e desleais por parte das corporações e suas ramificações. A naturalidade do diálogo reclama espontaneidade para seu desenvolvimento, condição salutar para a comunicação democrática e requisito funcional para a livre economia de mercado.
Os perigos de uma economia automatizada não se restringem aos perfis de consumo, mas à própria condição de consumidor por parte substancial das populações, o que pressupõe conceitos de inclusão, proteção e acesso. Enquanto países desenvolvidos reconhecem os grandes percentuais de desemprego como provenientes da nova formatação econômica – flexível e customizada –, quadro a se intensificar pela automação iminente de um sem número de profissões e postos de trabalho, a superficialidade na cacofonia nacional causa espanto. Trata isso como mero desalinho ao fator crescimento, considerado como único remédio para todos os males.
Uma pregação pelo crescimento econômico em fundamentos tradicionais ignora as mudanças em curso, ou por vir, a modificar sensivelmente produtos ou serviços. Em postura inversa, por exemplo, vários países estabeleceram metas de substituição dos combustíveis fósseis, movimento a redesenhar as matrizes energéticas de suas economias e, por conseguinte, dos próprios produtos e serviços a serem ofertados ao consumidor. Outros planejam adaptações massivas em razão dos impactos ambientais decorrentes das alterações climáticas, inclusive para reconhecer a troca de culturas agrícolas costumeiramente produzidas.
Tratar com seriedade e responsabilidade assuntos relativos ao consumidor contemporâneo é prestigiar uma gama de temas transversais a interagir com o CDC e outros contextos não regulados. Implica ir mais além da superficialidade das discussões e reconhecer os tempos presentes de automação da vida e das coisas.
IOTTI
iotti@iotti.com.br
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