FERNANDO SOARES
fernando.soares@pioneiro.com
em carlos barbosa Liamara diz que barbearia já representa 40% do seu faturamento
As vacas da Serra dão mais leite do que as de outras regiões do Rio Grande do Sul e do Brasil. Os animais dos municípios serranos geram uma média por cabeça de 3,7 mil litros/ano, segundo a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado (Emater-RS). O índice é superior ao gaúcho, com 3,4 mil litros anuais, e vence com folga o brasileiro, que atinge 1,7 mil litros a cada 12 meses.
Responsável por apenas 9% da produção e 8% do rebanho do Rio Grande do Sul, a Serra tem particularidades que a tornam uma campeã de produtividade. Um dos principais ingredientes, neste sentido, é o padrão genético. As vacas costumam ser criadas em regimes de confinamento, parcial ou total. Sendo assim, a reprodução geralmente ocorre por inseminação artificial e é acompanhada de perto por geneticistas.
As duas grandes empresas de laticínios da região, Piá e Santa Clara, possuem especialistas que trabalham exclusivamente com melhoramento genético. Isso acaba se refletindo nos números gerais da região, que conta com 12,5 mil produtores de leite. Somente as cooperativas somam mais de 6 mil associados, que acabam se beneficiando dos serviços disponibilizados por elas.
– Não se faz aventura genética. Há um trabalho de melhoramento genético na região há muitos anos que gera essa evolução – aponta João Luz, assistente técnico da Emater Caxias do Sul, que atende a 49 municípios no entorno.
O presidente da Associação Gaúcha de Laticinistas e Laticínios (AGL), Ernesto Krug, destaca que a melhora na qualidade da assistência técnica também contribuiu para aperfeiçoar o manejo e a sanidade, fatores com influência direta na produção. Doenças graves, como tuberculose e brucelose, atualmente estão sob controle.
Krug ainda menciona que a Serra se diferencia dos demais lugares por ter propriedades pequenas, com média de 37 hectares, o que exige maior profissionalismo na gestão.
– A Serra tem propriedades menores, que buscam crescer em escala de produção. E o produtor é especializado, dedica-se apenas ao leite.
Região mais produtiva
O conjunto de fatores faz com que a Serra seja a região com maior produtividade no Rio Grande do Sul e, por tabela, no Brasil, conforme avalia o assistente técnico da Emater em Caxias João Luz. No entanto, Luz ressalta que existem casos pontuais de vacas em outros Estados que conseguem resultados mais expressivos.
Por municípios, Araras (SP) tem o melhor desempenho, com média superior a 13 mil litros/ano por vaca, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Entre os 10 maiores resultados, porém, estão duas cidades gaúchas e serranas: Carlos Barbosa e Vila Flores. Elas ocupam a quinta e sexta colocações, respectivamente.
Em Barbosa, a produtividade é de 6,8 mil litros/ano por cabeça. O produtor João Grespan tem participação direta neste cenário. Em sua propriedade, cada uma das 42 cabeças em lactação rende 10 mil litros anualmente. E os números sobem a cada temporada. Em 2016, tiravam-se 900 litros de leite do rebanho por dia. Neste ano, são 1,3 mil litros.
– Temos pouca área de terra, temos que crescer pela produtividade. A genética nos ajuda a aumentar de 15% a 18% a produção ao ano – justifica.
Na propriedade de Grespan, as atividades são divididas e executadas com a precisão de um relógio suíço durante os 365 dias do ano. Ele cuida da limpeza das vacas, enquanto a esposa faz a ordenha. Os filhos, que estudam Agronomia e Zootecnia, cuidam do solo, da produção de alimentos e da genética. Já a filha faz a contabilidade da granja. Juntam-se a eles dois técnicos, que dão consultoria nas áreas de reprodução e alimentação. A soma do esforço coletivo é o que resulta em alta produtividade.
O Rio Grande do Sul é o terceiro Estado que mais produz leite, perdendo para Minas Gerais e Paraná . Já em produtividade, o resultado gaúcho é o melhor do país.
A tecnologia tem sido aliada de uma série de propriedades da Serra, configurando-se em outro aspecto que explica o incremento na produtividade de algumas localidades. Em 2015, Ezequiel Nólio, um dos proprietários da Tambo Nólio, de Paraí, foi o primeiro no país a apostar na utilização de robôs para a realização da ordenha. Dois anos depois, já colhe os resultados. A produção média por vaca passou de 28 para 35 litros ao dia.
A máquina está junto ao pavilhão onde as 63 vacas holandesas de Nólio ficam. Os próprios animais se dirigem ao equipamento no momento que acharem oportuno. Desta maneira, não há horário fixo para a ordenha e nenhum tipo de intervenção humana ocorre. Ezequiel Nólio conta que os animais chegam a fazer fila para entrar no box. A máquina reconhece cada vaca, fornece ração em medida controlada e coleta uma série de informações sobre a qualidade do leite gerado.
– O investimento foi em torno de R$ 900 mil, entre a máquina e adaptações do pavilhão. O retorno se dará em pouco mais de cinco anos, com aumento na produtividade e redução de consumo de ração. E vamos ganhar uma lactação a mais por cada vaca – celebra Nólio.
A utilização de robôs ainda é tímida no Rio Grande do Sul e no resto do Brasil. Isso não quer dizer que a ordenha ainda seja feita à mão, como antigamente. Na maior parte das propriedades da Serra, assim como ocorre em outras regiões, são utilizados equipamentos para fazer a transferência do leite do úbere direto para o tanque de resfriamento e medir a produção.
FORMADOR DE CAMPEÃS Vacas de Tang, de Farroupilha, acumulam títulos em eventos
Algumas das vacas com maior produtividade do Brasil são de Farroupilha. A Granja Tang, localizada no interior do município, coleciona títulos em feiras, exposições e campeonatos que medem a produção média dos animais. Com essa credencial, o comércio de embriões e de outros aspectos genéticos e a venda de animais se tornaram um negócio para a cabanha, que possui 40% do seu faturamento oriundo dessa área.
O histórico de produtividade elevada vem de longa data. Durante 2009 a 2013, a granja chegou a ter uma recordista nacional. Era a vaca holandesa Raquel, que chegou a fazer 20 mil litros de leite ao ano. A Raquel já faleceu, mas o atual plantel de 31 vacas em lactação conta com sua neta e sua bisneta.
Entretanto, a nova estrela do grupo é a vaca Sali. Dona de uma média anual de 17 mil litros, recentemente ganhou o concurso leiteiro da Expointer. Com três anos de idade, venceu na categoria jovem, gerando 66 quilos de leite. O resultado foi superior até ao da campeã adulta, que produziu 52 quilos.
Com suas três dezenas de vacas, a granja farroupilhense tem uma produtividade de 11,8 mil litros ao ano por cada animal. O segredo para o desempenho está em fatores característicos da região. A propriedade é pequena, com 14 hectares, e tem dedicação exclusiva ao gado leiteiro. Também influenciam no resultado cuidados com genética e a alimentação equilibrada entre proteínas, silagem, feno e capim.
Além disso, um ingrediente é fundamental: o trato com os animais. A ordenha é feita com 12 horas de intervalo, para evitar lesões no úbere. As vacas permanecem a manhã soltas no pasto. Isso permite que se movimentem e até mesmo interajam. E cada vaca tem um nome, geralmente uma homenagem a parentes e amigos da família.
– As vacas também gostam de tomar sol e passear, como os humanos. E cada uma tem sua própria personalidade. Tem vaca dócil e tem vaca mais agressiva que briga com as outras – conta Itamar Tang.
A produção de leite da Tang é toda gerada por vacas holandesas. Essa raça, aliás, é predominante no Rio Grande do Sul. Segundo a Emater, mais de 650 mil animais no atual rebanho gaúcho são holandeses. Na Serra, existem 53 mil cabeças de gado holandês.
À frente Rejane lidera agroindústria que faz queijo colonial
Nova Bassano hoje tem mais vacas do que habitantes. Maior produtora de leite na Serra, com 57 milhões de litros gerados por ano, a cidade de 8,8 mil pessoas conta com 10,5 mil cabeças de gado leiteiro.
A produção ganhou musculatura ao longo dos últimos anos e ocasionou uma mudança profunda no perfil econômico do município. Diversas famílias de agricultores trocaram os hortifrutigranjeiros pela dedicação ao leite. E algumas delas decidiram ir além e agregaram valor ao produto gerado pelos rebanhos.
É o caso da produtora Rejane Tessaro. O avô dela começou na atividade rural com o plantio de verduras e frutas, como repolho, pimentão e tomate. A criação de vacas leiteiras era algo secundário. Oito anos atrás, o cenário se transformou.
O baixo preço dos hortifrútis e o desgaste gerado pelo uso de agrotóxicos no plantio fizeram com que a família Tessaro optasse apenas pela produção de leite. A partir de então, o plantel passou de 30 para 50 cabeças em lactação. Hoje, são 40 de raça holandesa e 10 jerseys.
O maior passo, entretanto, foi dado em 2011, quando Rejane liderou a criação de uma queijaria na propriedade. Desde então, o foco é total na fabricação de queijos. A produtora toca o negócio ao lado do marido e seus pais, além de contar com o auxílio de dois funcionários. A empresa garantiu incremento significativo na renda familiar.
– Meu sonho sempre foi ter algo próprio. E queríamos agregar valor à matéria-prima que produzíamos. Arriscamos com a queijaria e deu certo. A nossa renda anual é 30% maior do que se só vendêssemos leite – explica Rejane.
Os 1,2 mil litros de leite captados diariamente são transformados em cerca de 3 toneladas de queijo colonial a cada mês. A venda ocorre principalmente em pontos localizados em Nova Bassano e na vizinha Serafina Corrêa. A estrutura ainda tem condições de produzir manteiga e iogurte, conforme a demanda.
A maré não anda favorável para os produtores leite. No Rio Grande do Sul, mais de 20 mil pessoas deixaram a atividade nos últimos dois anos, conforme a Emater-RS. Um dos principais motivos é o baixo preço pago pelo líquido. No Estado, o valor do litro está em R$ 1,15, conforme o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Universidade de São Paulo (USP). Em agosto do ano passado, chegou-se a remunerar a R$ 1,64 por litro.
– Se não mudar a situação, parte da produção vai morrer mesmo. É a pior crise desde que começamos a produzir leite. Em cada litro vendido hoje, temos prejuízo de R$ 0,20 – comenta o produtor Itamar Tang.
A concorrência com o leite importado do Uruguai agrava a situação. O produto do país vizinho vem principalmente em forma de queijo e leite em pó e chega com preço mais competitivo no mercado nacional. Em função da crise no setor, o Ministério da Agricultura suspendeu, na primeira quinzena de outubro, a emissão de licenças de importação junto aos uruguaios. A intenção do governo federal é controlar a compra no exterior por meio de cotas.
– Neste ano, o Uruguai colocou em torno de 6 mil toneladas por mês de queijo e leite em pó no mercado brasileiro. No ano passado, foram 10 mil toneladas por mês. Esse volume prejudica o crescimento da bacia leiteira do Rio Grande do Sul e do Brasil – constata Darlan Palharini, secretário executivo do Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados do Rio Grande do Sul (Sindilat).
O dirigente lembra que já incide cota sobre a Argentina e defende uma limitação de 3 mil toneladas/mês aos uruguaios.
Neste momento, confiança é fundamental. A confiança em nós mesmos. A convicção de que somos maiores do que qualquer obstáculo
Vacas serranas geram, em média, 3,7 mil litros de leite ao ano, superando desempenho gaúcho e brasileiro
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