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01 DE OUTUBRO DE 2018

+pecuária

O robô tira o leite

tecnologia se torna aliada de criadores de gado leiteiro na gestão das propriedades

Mobirise



FERNANDO SOARES
fernando.soares@pioneiro.com

DIOGO SALLABERRY

Mobirise

o primeiro | Ezequiel Nólio é responsável pela gestão da propriedade em Paraí que foi a pioneira na utilização de robôs de ordenha. Desde 2015, a atividade é feita pela máquina

Cheias de leite no úbere, as vacas vão se aproximando sozinhas da sala de ordenha instalada no pavilhão. Assim que um animal passa a porta de entrada e se acomoda dentro da estrutura, um braço robótico começa a atuar. Em questão de segundos, a máquina encaixa as teteiras, por onde passarão litros do líquido com destino ao tanque resfriador. Enquanto isso, os demais gados aguardam, do lado de fora, a vez para serem ordenhados. Tudo acontece espontaneamente, sem interferência humana. Há três anos, essa cena ocorre durante as 24 horas do dia no Tambo Nólio, em Paraí. Aos poucos, a situação começa a se tornar comum também em outras propriedades do Rio Grande do Sul.

A família Nólio foi a pioneira na robotização da ordenha no Estado. Em 2015, o produtor Ezequiel Nólio e seus pais investiram mais de R$ 900 mil na aquisição de um robô e em melhorias estruturais para a adaptação ao sistema. Junto ao equipamento, foi instalado um software, que gera relatórios em tempo real sobre a produtividade e a saúde dos animais. A opção pela tecnologia mudou radicalmente a rotina na propriedade.

– A prioridade não é mais fazer a ordenha, mas sim tomar decisões em cima dos dados gerados pela própria máquina. Antes tu ficavas muito no acho e no se. Hoje, dá para gerir melhor a propriedade e decidir, por exemplo, qual vaca fica e qual é descartada – relata Ezequiel Nólio, responsável por gerir a propriedade.

O produtor salienta que o único arrependimento foi não ter colocado robôs antes. Isso porque ele notou uma melhora na própria qualidade de vida. Já não é mais necessário acordar às 5h da manhã para ordenhar as vacas, que agora escolhem o horário que desejam fornecer o leite. Ele trabalha pela manhã e tem as tardes livres. Além disso, não é mais necessária mão de obra na ordenha. Antes, três funcionários ajudavam na tarefa.

No local, os mais de 60 gados do rebanho geram em torno de 2,3 mil litros de leite por dia, que são entregues à cooperativa Santa Clara. Antes do robô, era produzida a mesma quantidade da bebida, mas com 80 cabeças. Por conta da adoção do sistema robótico, o Tambo Nólio virou atração turística em Paraí. Por mês, em torno de 500 pessoas, entre estudantes, pecuaristas e profissionais de diferentes áreas, visitam a propriedade para entender como funciona o novo jeito de ordenhar.  

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No Estado, as propriedades com robôs estão em Arroio do Meio, Barão de Cotegipe, Candelária, Carlos Barbosa, Erechim, Guaporé, Muitos Capões, Nova Bassano, Nova Bréscia, Paraí (duas), Pontão (duas) Roca Sales, Vacaria e Vespasiano Corrêa.

Sistema ainda restrito 


Atualmente, 16 estabelecimentos contam com robôs de ordenha no Rio Grande do Sul. Eles estão espalhados por 14 municípios do Estado. A maioria dessas propriedades, sete delas, se localiza na Serra. Apesar do avanço do modelo robotizado nos últimos anos, a tecnologia está restrita a um grupo pequeno de produtores gaúchos, em função do alto investimento necessário na implementação.

– Por muito tempo ainda deverá ser uma tecnologia restrita ao produtor de vacas de alta produtividade, que capta a partir de 2 mil litros de leite por dia. Por isso, ter robôs não é uma coisa para a maioria dos produtores – aponta Jaime Ries, assistente técnico da Emater-RS especializado em gado leiteiro.

Hoje o Estado conta com cerca de 65 mil produtores de leite, mas no máximo 1 mil deles teriam potencial para automatizar a ordenha. Essa é a estimativa do presidente da Associação Gaúcha de Laticinistas e Laticínios (AGL), Ernesto Krug. Mesmo assim, lembra Krug, a adoção do sistema é uma tendência mundial, por ser mais eficiente do que a mão de obra humana e proporcionar ganho de produtividade.

– Com o robô, a vaca é mais ordenhada, de duas a quatro vezes por dia. Como ela vai à sala no horário que preferir, aumenta o conforto do animal. Isso gera um incremento médio de 10% na produtividade, que pode variar em cada propriedade – avalia.

O dirigente destaca que o sistema pode ser vantajoso para propriedades com mais de 60 cabeças e que adotam o sistema de confinamento dos animais. Entretanto, Krug reforça que, para saber se o investimento compensa, cada caso deve ser analisado individualmente.








Dados do sistema embasam melhoramento genético

diogo sallaberry

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qualidade |  Cichelero notou melhora na matéria-prima do queijo

Mais do que automatização do processo de ordenha, o uso de robôs fornece um arsenal de informações para os produtores tomarem decisões. Por meio desses dados, um dos principais aspectos trabalhados nas propriedades é o melhoramento genético. Como o sistema gera relatórios em tempo real e armazena o histórico de produção, é possível identificar quais são os animais com melhores resultados e até o momento em que é mais adequado reproduzi-los.

Também há como detectar problemas de saúde nos animais e controlar a alimentação com mais precisão. Isso porque o fornecimento de ração acaba sendo realizado pelo próprio robô, que libera o alimento no momento da ordenha e de acordo com a produtividade da vaca.

Como resultado do investimento de R$ 1,4 milhão na aquisição de dois robôs de ordenha e em melhorias estruturais, o produtor Daniel Cichelero, de Carlos Barbosa, viu a matéria-prima de sua queijaria ganhar qualidade. Após a adoção da tecnologia, o leite vem apresentando incremento nos sólidos, como gordura e proteína, aspectos importantes na fabricação de queijos finos, foco do negócio da Granja Cichelero.

– Conseguimos aumentar em 5% a produtividade do rebanho, mas o principal incremento é na qualidade do leite. Reduzimos em 60% a contagem de células somáticas no leite desde que implantamos robôs (quanto menos células, mais saudável está o animal) - afirma Daniel Cichelero.

Ao todo, as 120 vacas do rebanho em lactação produzem 4,6 mil litros de leite ao dia, que são transformados em 520 quilos de queijos. Anteriormente, a produção ficava no mesmo patamar, mas com um número de animais maior. Além disso, a propriedade necessitava três equipes de ordenha, totalizando seis pessoas. No momento, permanecem três funcionários, que passaram a ter outras prioridades, como analisar os dados gerados pelo sistema e cuidar das novilhas.







Rio Grande do Sul lidera o
uso da tecnologia no país

DIOGO SALLABERRY

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fila |  Enquanto uma vaca é ordenhada, as demais aguardam a vez

Dono do gado leiteiro com maior produtividade do país, o Rio Grande do Sul também é o líder na robotização da ordenha. Nenhum outro Estado possui mais produtores com robôs em operação. Em solo gaúcho, a tecnologia começou a ser utilizada em 2015 e já está presente em 16 propriedades. E a expansão poderia ter sido mais rápida, não fosse a crise enfrentada pelo setor leiteiro, sobretudo no ano passado, com a queda da remuneração dos profissionais da atividade.

Mais recentemente, outro fator se tornou um obstáculo para o avanço da robotização: a escalada da cotação de moedas como o dólar e o euro. Atualmente, três fabricantes de origem europeia atuam no país e importam os equipamentos de Alemanha, Holanda e Suécia. E, por isso, o preço no mercado nacional acaba acompanhando a oscilação do câmbio.

– Claro que a crise no setor e a alta do dólar impactaram um pouco a procura pelos robôs, mas vemos uma tendência de crescimento da robotização nos próximos anos – aposta Valdair Kliks, representante comercial da holandesa Lely no Brasil.

Um robô costuma custar a partir de R$ 600 mil. Com a realização de outras reformas na propriedade visando à adaptação ao sistema, o valor a ser desembolsado pode passar facilmente de R$ 1 milhão. Como o investimento é significativo, algumas empresas começam a oferecer um serviço de aluguel do equipamento. É o caso da sueca DeLaval, que já tem boa parte da demanda vinda dessa modalidade.

– O custo do aluguel sai em torno de R$ 5,5 mil mensais e a procura está muito forte. Devemos instalar 33 robôs até o final do ano, a maioria por aluguel – menciona Márcio Gato, gerente comercial da DeLaval no Rio Grande do Sul.

Custos à parte, a decisão de colocar robôs de ordenha nas propriedades passa por outros fatores. A melhora na qualidade de vida do produtor, que não precisa mais madrugar para tirar leite dos animais, e a redução da necessidade de contratação de funcionários, estão entre os principais motivos que embasam a compra do equipamento.

– O robô traz um ganho de flexibilização de horários. Com o sistema andando sozinho, o produtor consegue gerenciar a propriedade se adequando às suas necessidades. No modelo tradicional de ordenha, ele fica “preso” os sete dias da semana para tirar leite da vaca – compara Pedro Hepp, representante comercial da alemã GEA.

Com o robô, a ordenha ocorre ininterruptamente. No dia, os animais costumam ser ordenhados três vezes, mas algumas vacas podem realizar até cinco ordenhas diárias. Segundo os produtores que já adotaram o sistema, o fato de a ordenha ser realizada mais vezes, em diferentes períodos, melhora o bem-estar dos animais e diminui problemas de saúde, como a mastite (inflamação das glândulas mamárias). 
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O rebanho dos produtores que possuem robôs é composto majoritariamente de vacas holandesas. No entanto, há máquinas que também se adaptam a animais de menor porte, como os da raça jersey.

O impacto na indústria

O aumento de produtividade nos rebanhos e o melhoramento genético dos animais proporcionados a partir do uso da tecnologia poderá abrir novas oportunidades para a indústria. Com a melhora da matéria-prima enviada às fábricas, a tendência é de que suba a qualidade dos produtos que chegam até o consumidor. No entanto, esse impacto deve ser sentido a longo prazo, de acordo com o secretário executivo do Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados do Rio Grande do Sul (Sindilat-RS), Darlan Palharini.

– No Rio Grande do Sul ainda há muito espaço para melhoramento genético. E trazendo o robô para as propriedades é possível trabalhar em cima disso, aumentando o índice de sólidos no leite. Isso vai gerar uma conversão industrial maior em alguns produtos, como os queijos – constata o dirigente.

Palharini ainda aponta que um leite com maior teor de sólidos proveniente das granjas gaúchas poderá otimizar a produção. O dirigente menciona que, hoje, para fabricar um quilo de leite em pó são necessários mais de 9 litros de leite cru. Enquanto isso, em outros países, a indústria costuma utilizar pouco mais de 8 litros.

No Estado, as cooperativas têm tido um papel importante na disseminação dos robôs de ordenha. Nos últimos anos, a Dália Alimentos investiu na estruturação de quatro granjas equipadas com três máquinas cada. Os chamados condomínios leiteiros estão em Arroio do Meio, Candelária, Nova Bréscia e Roca Sales e envolvem mais de 50 famílias associadas.

– Cada condomínio possui em torno de 210 vacas, atingindo uma produção de 6,3 mil litros por dia – destaca Igor Weingartner, gerente da divisão de produção agropecuária da Dália.

Já a Santa Clara, de Carlos Barbosa, foi a primeira cooperativa a ter um associado com ordenha robotizada. Ezequiel Nólio segue sendo o único que produz com a ajuda de robôs, mas existem outros produtores ligados à empresa que estão em vias de adotar a tecnologia.

– É um caminho sem volta. Até porque o robô melhora a qualidade de vida do produtor e ajuda a manter a continuidade da atividade leiteira nas propriedades – diz Maurício Bonafé, gerente do departamento de política leiteira da Santa Clara. 

Como funciona a ordenha robotizada

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