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19 DE OUTUBRO DE 2018

+agropecuária

Cooperativismo na sala de aula

Alunos da Escola Agrícola da Serra aprendem a teoria e colocam na prática aspectos relacionados ao universo das cooperativas 

Mobirise



FERNANDO SOARES
fernando.soares@pioneiro.com

diogo sallaberry

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toda semana | Professora Ivone Manica é responsável por conduzir as aulas de cooperativismo

A professora Ivone Manica entra na sala de aula e, em seguida, começa a repassar com os estudantes os conteúdos vistos na semana anterior. Caminhando pelo recinto, ela faz perguntas aos alunos da turma do primeiro ano do ensino médio.

– Quantas pessoas são necessárias para abrir uma cooperativa?

Após um breve silêncio, um estudante responde.

– Pelo menos 20.

E o debate segue na classe, sempre em cima de questões relativas ao universo do cooperativismo. Logo, são abordados assuntos como os ramos da atividade e as funções do presidente e dos conselheiros. Essa é a rotina verificada às terças-feiras na Escola Família Agrícola da Serra Gaúcha (Efaserra), sediada na Terceira Légua, em Caxias do Sul. A instituição de ensino tem na sua grade curricular uma disciplina chamada cooperativismo e empreendedorismo, que divide espaço com as matérias tradicionais, como matemática, português e história.

– Explicamos na aula como funciona uma cooperativa, como se abre uma empresa, toda a parte burocrática. E também abordamos como se pode cooperar em casa, na escola, na sociedade – afirma Ivone, que já foi conselheira de uma cooperativa de crédito e hoje ministra as aulas.

Fundada em 2013, a Efaserra oferece o ensino médio e curso técnico em agropecuária aos jovens de diferentes municípios da região. Um dos principais objetivos do estabelecimento é combater o êxodo rural e garantir a sucessão nas pequenas e médias propriedades rurais. E, dentro deste contexto, o cooperativismo é visto pela diretoria como uma ferramenta importante para estimular a permanência da juventude no campo.

– O serviço prestado pelas cooperativas, tanto na venda dos produtos, como na assistência técnica aos produtores, acaba facilitando a vida do jovem e sua família no campo. Por isso, a escola tem na sua raiz essa matéria de cooperativismo – salienta Israel Matté, diretor da Efaserra.

Além disso, o perfil econômico da região é outro motivo que levou à implementação da matéria. Atualmente, a Serra possui 29 cooperativas agrícolas, espalhadas em atividades como apicultura, fruticultura, vitivinicultura e produção de laticínios. No Rio Grande do Sul como um todo, a agropecuária é o ramo que mais reúne cooperados. São 133 mil de associados nas 128 empresas gaúchas do setor, que faturaram mais de R$ 26 bilhões em 2017.

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Atualmente, a Efaserra conta com 79 alunos, oriundos de 17 municípios da região. Pela metodologia de ensino, eles intercalam uma semana de aulas na escola e outra de trabalhos na propriedade rural da família.






Estudantes estreitam
relação com o setor

DIOGO SALLABERRY

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do primeiro ano |   Natália (E) passou a conhecer sobre as cooperativas na aula, enquanto Lorenzon (C) e Maísa (D) são associados

Além dos conteúdos teóricos abordados pela professora em sala, as aulas também contam com a participação de dirigentes de cooperativas. Periodicamente, eles são chamados para conversar com os alunos e relatar suas experiências na área. Neste sentido, a escola acaba proporcionando o primeiro contato de alguns alunos com o cooperativismo. É o caso de Natália Lima, 15 anos.

– Eu não sabia o que eram as cooperativas. Quando entrei na escola e conheci a matéria, procurei saber mais. Quero no futuro me associar – planeja.

Natália e sua família trabalham com gado de corte, em São Francisco de Paula. Ao todo, a propriedade conta com mais de 1 mil cabeças. No futuro, a jovem quer se tornar engenheira agrônoma e pensa em se vincular a uma cooperativa que possa lhe ajudar no trabalho rural, possivelmente do setor de crédito.

A maioria dos alunos do primeiro ano do ensino médio, no entanto, já possui algum vínculo com cooperativas. Na turma deste ano, 22 dos 28 estudantes são de famílias associadas a empresas do setor. O estudante Gabriel Lorenzon, 15 anos, por exemplo, possui sua conta bancária no Sicredi. Na família Lorenzon, que produz queijos em Carlos Barbosa, todos são associados no ramo de crédito.

– Acho muito bom saber mais da história do cooperativismo e praticar (os valores) no dia a dia na escola – diz.

Uma parcela significativa dos alunos vem de famílias voltadas à produção de uva, a principal cultura da Serra e que é matéria-prima de grande número de cooperativas na região. A estudante Maísa Molon, 16 anos, trabalha com o plantio da fruta em Flores da Cunha e sua família é associada à Nova Aliança. Com o auxílio da cooperativa, os Molon converteram os seus seis hectares de parreirais para o modelo orgânico, dispensando o uso de produtos químicos.

– Cooperar é muito importante no dia de hoje. Uma cabeça só não pensa como várias juntas. O trabalho coletivo é melhor e mais grandioso – acredita a jovem.

Maísa pretende continuar a produção de orgânicos e já pensa em ampliá-la. A partir dos conteúdos abordados na escola, surgiu a ideia de trabalhar com outras culturas além da uva.







Em feira, alunos colocam em prática
os conteúdos 

MARCELO CASAGRANDE

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na feira |   Ana Júlia tem seu primeiro contato com consumidores

Ainda que a disciplina de cooperativismo seja ministrada apenas para os alunos do primeiro ano do ensino médio, a temática continua sendo abordada nas séries seguintes. E até mesmo de maneira prática. Uma das iniciativas derivadas da matéria voltada à cooperação foi a criação de uma feira pedagógica, aberta ao público, na qual os estudantes comercializam os produtos que trazem de suas propriedades e são responsáveis por montar as barracas, controlar os estoques e negociar diretamente com os compradores.

Realizada quinzenalmente, às segundas e terças-feiras, na própria Escola Família Agrícola da Serra, a feira foi criada em abril do ano passado. No início de 2018, ela acabou se tornando uma matéria no currículo da instituição de ensino. Neste semestre, 28 alunos do segundo ano e 11 do terceiro participam da iniciativa. A cada edição, um grupo com 14 jovens se reveza nas funções de organização, que vão de recepcionar os visitantes na entrada da escola a até fazer a contabilidade das vendas.

O professor da Efaserra responsável por monitorar a disciplina, Cláudio Klippel, destaca que a feira permite que os alunos se acostumem com as situações enfrentadas no dia a dia pelos feirantes profissionais. Inclusive, aprendem a lidar com cenários adversos.

– Às vezes vem menos público, às vezes sobra produto. Eles têm toda essa experiência aqui. A feira é um laboratório – compara Klippel.

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A feira conta com frutas, hortaliças e alimentos de diferentes tipos. Os campeões de vendas costumam ser os queijos coloniais e salames.

A estudante do segundo ano Ana Júlia Dani, 18 anos, relata que a participação na feira proporcionou sua primeira experiência direta com o público consumidor.

– É muito bom fazer a feira na escola, porque eu não tinha contato diário com o público. Aqui, consigo falar e mostrar a qualidade do meu produto e o dos meus colegas também – aponta.

Ana Júlia costuma trazer para a feira o pêssego colhido na propriedade de sua família, localizada em Caravaggio da Terceira Légua, no interior de Caxias do Sul. A partir de novembro, com o início da colheita da uva, ela também deve levar a fruta típica da Serra às feiras.

A maioria das famílias dos alunos costuma comercializar os alimentos para intermediários. Por isso, uma das principais vantagens proporcionadas pela venda direta na feira é o incremento na renda. Dependendo do produto, é possível ganhar de 10% a 20% a mais, por conta da ausência do atravessador.

– Vendendo a uva direto para o consumidor conseguimos um preço um pouco maior do que vendendo para a cantina – exemplifica o estudante Alexandre Mello, 18 anos.

No atual curso, iniciado em junho, já foram realizadas cinco edições do evento, com um faturamento superior a R$ 2,3 mil. A média de vendas é de R$ 470 por feira. No dia com mais negócios, o caixa dos alunos registrou o ingresso de R$ 1,1 mil.

Os valores obtidos são repartidos igualmente entre todos os participantes, emulando a distribuição de sobras realizada pelas cooperativas. Antes da distribuição, 10% da arrecadação é separada para um caixa único dos estudantes, que decidem coletivamente como irão utilizar os recursos. No ano passado, o grupo optou por investir o dinheiro na aquisição de uma nova balança e por destinar o restante para um passeio de final de curso.







Objetivo é criar cooperativa
escolar em 2019

O próximo passo a ser dado pelos alunos da Escola Família Agrícola da Serra deve ser a criação de uma cooperativa escolar. Esse tipo de estrutura funciona como uma espécie de simulador de uma cooperativa real. Sendo assim, os estudantes vão determinar o tipo de negócio a ser realizado e assumirão as funções administrativas do empreendimento, atuando em cargos como presidente, diretor ou conselheiro.

O diretor da Efaserra, Israel Matté, comenta que a tendência é utilizar a feira pedagógica como base para a montagem da cooperativa escolar. Isso porque, no evento, os alunos já desempenham atividades semelhantes às de um negócio cooperativo. A expectativa é por viabilizar a estrutura até o início de 2019.

– Imaginamos que podemos aproveitar a feira, por já estar estruturada. Mas daqui a pouco os alunos podem querer lançar algum outro produto. Eles é que vão decidir – argumenta Matté.

Se os alunos montarem a cooperativa escolar em cima da feira, isso poderia abrir novos espaços para os produtos da agricultura familiar. Além de realizar a comercialização dentro da escola, no interior de Caxias do Sul, os estudantes poderiam levar o evento a outros pontos mais centrais da cidade e mostrar o seu trabalho a um público maior.

Apesar de venderem produtos e realizarem movimentações financeiras em pequena escala, as cooperativas escolares têm como principal objetivo a aprendizagem. Através delas é possível abordar assuntos como educação financeira e empreendedorismo no ambiente escolar.

– Através dessa vivência prática, os jovens aprendem a conduzir reuniões, calcular custos de produção, fazer atas, a tomar decisões e a discutir o seu negócio – resume Everaldo Marini, pesquisador e assessor pedagógico que presta consultoria na área a escolas de todo o Brasil.

Em geral, essas estruturas coletivas são organizadas por alunos de ensino médio. Artesanatos e alimentos costumam ser os produtos mais escolhidos para a venda. Para registrar o coletivo, os alunos entregam a documentação na secretaria da instituição de ensino e no conselho municipal da criança e do adolescente.

No Rio Grande do Sul, o Sindicato e Organização das Cooperativas do Estado (Ocergs) também deve receber uma cópia do material. A entidade faz o reconhecimento das cooperativas escolares, fornecendo um certificado aos estudantes. Os gaúchos são referência na atividade, já que se responsabilizam por quase uma centena das 170 cooperativas escolares instaladas em todo o país.

Cooperativas escolares da Serra

Caso a Escola Família Agrícola da Serra Gaúcha (Efaserra) leve adiante seu projeto de criação de uma cooperativa escolar, ela será a 29ª em atuação na região. Em todo o Rio Grande do Sul, hoje existem 93 estruturas do gênero, espalhadas por 43 municípios, conforme aponta o Sindicato e Organização das Cooperativas do Estado do Rio Grande do Sul (Ocergs). Teutônia, com 10 cooperativas, lidera a lista. Em seguida aparece Nova Petrópolis, que possui nove unidades.

Região pioneira no cooperativismo, por ter sido o berço de algumas das primeiras empresas do tipo no Estado, a Serra concentra quase um terço das cooperativas escolares do Estado. Confira onde elas estão instaladas.

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