A tela de 2016

O impeachment da presidente Dilma Rousseff, os primeiros meses do governo de Michel Temer, tudo em um mesmo pacote, em um enredo de tirar o fôlego. A tragédia do voo da Chapecoense, que resultou na morte de 71 pessoas no final de novembro. A crise sem fim da economia, que chega a dezembro com a cifra estrondosa de 12,1 milhões de pessoas desempregadas no Brasil. O parcelamento inominável de salários para os servidores públicos do Estado, situação dramática que percorreu o ano todo, desde fevereiro. O recorde de homicídios em Caxias do Sul. As dificuldades da safra da uva. As novidades no cotidiano das pessoas, a implantação do SIM Caxias, as vagas na educação infantil que não dão conta da necessidade das famílias caxienses, a UPA da Zona Norte que não abre, o esvaziamento do Centro. A eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, a renovação promovida pelas eleições de outubro para as prefeituras e Câmaras do Brasil, o fenômeno do candidato gestor, com discurso contundente contra a política tradicional, que teve em Jorge Doria (PSDB), escolhido em primeiro turno pelos paulistanos, o expoente máximo. Fenômeno que teve em Daniel Guerra (PRB) o seu representante caxiense, escolhido em votação histórica pela população para comandar Caxias do Sul pelos próximos quatro anos.

Todos esses elementos pincelaram centralmente a tela de 2016, que recebe neste sábado ainda os seus últimos retoques antes de entrar na galeria da história. Foram episódios e desdobramentos de visibilidade e impacto, que imprimiram à pintura matizes de dificuldade, de dor. Dezesseis começa com a letra D. Dois mil e dezesseis também. 2016, pode-se dizer, foi um “Ano D”. Foi um ano difícil, desgastante, doído, dor multiplicada por 71 no final pela tragédia do voo da Chapecoense.

Mas acrescentem-se ainda as palavras devastação e drama. Apesar de todas as dificuldades do ano que escrevemos, ou pintamos, sintetizadas na relação que abre este texto, devem ocupar lugar central na tela de 2016 a devastação e o drama na cidade síria de Aleppo. A guerra por lá vem de 2012, mas produziu imagens terríveis nos últimos 12 meses. A guerra em Aleppo nos parece distante. Em geral, apesar das imagens impressionantes da cidade destruída, não nos interessamos o suficiente pelos pormenores. Afinal, há tanta coisa a fazer por aqui. Até que somos colhidos por outras fotografias, estas de crianças com rostos machucados, empoeirados, que acabam de ficar órfãs, expressão de quem não está compreendendo nada deste mundo que construímos, ou destruímos. As crianças de Aleppo, como a menina que centraliza esta página, como o menino Omran (página 18) não choram. O golpe é tamanho que sequer adotam a reação natural. Aleppo é a cidade onde as crianças não choram. Aleppo não pode nos ser estranha. Aleppo, apesar da distância, deve ocupar lugar central na tela de 2016.

Assim é o 2016 que todos nós pintamos juntos.

Retrospectiva fotográfica

Trabalharam na organização da Retrospectiva 2016, nesta e nas próximas 16 páginas: Adão Júnior, Adriano Duarte, Andreia Fontana, Andressa Oestreich (online), Charles Segat (ilustrações), Ciro Fabres Neto (coordenação), Guilherme Ferrari (online), Ivanete Marzzaro, Juliana Rech (diagrramação), Maristela Deves, Maurício Reolon, Porthus Junior (edição de fotos) e Silvana Toazza.

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